segunda-feira, maio 28, 2007

Piratas das Caraíbas 3: Nos Confins do Mundo (2007), Gore Verbinski


E a trilogia chega ao fim. Aquilo que começara como um filme manhoso baseado numa atracção da DisneyWorld e com uma personagem central bastante dúbia, e acabou como um dos mais inesperados sucessos de bilheteira (dando origem à inevitável sequela… isto tem sido um ano de sequelas, que coisa…) acabou. Espero que definitivamente (porque estes tipos de Hollywood nunca sabem quando parar, … um Rocky Balboa? Um Rambo IV? Um Die Hard IV?), porque o que vier mais, para mim, é mais provável estragar do que sublimar. Digo eu.

Ora, se eu fosse uma crítica de cinema à séria (que não sou: basta saber quem é o Jonh Cameron Mitchell para não arranjar emprego em nenhum jornal...) começava já por deitar abaixo o filme, porque o vi numa sala cheia de gente e pipocas em stereo (já era altura de alguém usar esse barulho irritante nalgum pedaço de música electroacústica…) e toda a gente gostou quando saiu. Eu, do alto da minha superioridade de crítica, que tem em casa DVDs da Critterion Collection e acha que não se faz cinema decente desde os anos 60, diria que é uma história cheia de trapalhadas, para ‘encher chouriços’ (expressão gira, tenho de a usar mais vezes), e que francamente se o um nem era grande espingarda como objecto fílmico digno de fazer parte da Sagrada História dos Filmes Artisticamente Onanistas (porque só dão prazer ao seu próprio autor) que os críticos a sério adoram confundir com a brejeira história do cinema puro e duro e cheio de nhanha de pipocas (é assim que se escreve ‘nhanha’? ignoro). Ah… que desperdício de película, diria eu se fosse uma verdadeira interessada do cinema. Por isso é que a arte está como está, só se vê porcarias… Uma história de piratas? Nada poderia estar mais longe do Errol Flynn do que aquele mariconço do Johnny Depp, etc etc etc.

Infelizmente para mim (que não consigo fingir que não gosto de alguma coisa só para dar ar de cool), achei o filme bastante bom. É claro que o primeiro foi a surpresa, o segundo tinha demasiado Orlando Bloom no ecrã para eu poder ver o filme em condições (ele estava sempre à frente do filme, que horror!), mas este… um bom final, bastante digno, blockbuster confesso e sem vergonha disso, bastante ciente que se não houvesse Jack Sparrow tinha sido um flop, e a segurança de que todos iriam correr às salas mal estreasse (e a vossa anfitriã não foi excepção), deu azo a que Verbinski se desse ao luxo (com a ajuda do budget, é claro) de colocar as cenas mais out de que me lembro de haver num blockbuster. Tão out que receei, quando as vi, de que o público fedorento e pipoqueiro que me rodeava por todos os lados, tipo CO2 em hora de ponta, explodisse em raiva, matasse o projeccionista e fizesse vestidos avant-garde da tela. (estou a escrever muito e ainda não disse nada sobre o filme, eu sei. Temos pena. O blog é meu, escrevo o que me apetecer…) Mas não é que o público gostou? Muito mesmo? Tenho de começar a pensar na hipótese assustadora que o público de cinema não é tão estúpido quanto certos resultados de top box-office querem fazer parecer…

Comecemos do início. Há um pequeno problema com esta coisa das trilogias: é preciso ter muito boa memória. Ainda mais porque o segundo filme acabou em suspenso, e até que uma pessoa se lembrasse de quem andava enrolado com quem e quem é que andava a trair quem demorou um bocadinho. Grande momento inicial com a música. Talvez o ho ho ho and a bottle of rum tivesse um efeito mais poderoso, mas mesmo assim, estupendo. Como se trata de um filme americano de grande orçamento, será preciso falar da extrema qualidade de filmagem e fotografia? Não me parece. Belíssimas imagens, como quando Jack Sparrow está no Cofre de Davy Jones a liderar-se a si próprio, ou quando o Pérola Negra cruza um mar cheio de estrelas, a confundir-se com o céu, ou mesmo o gelo, e o remoinho, e… ah, belas imagens mesmo.

Depois, a entrada do nariz de Sparrow em cena. Depp é um dos melhores actores da actualidade, quem o nega vai arder no inferno. E com esta personagem… orgásmico. Estamos sempre à espera de ver mais um bocadinho dele, mais um tique, mais um ‘savy?’. O Orlando Bloom não lhe chega aos calcanhares, e felizmente neste filme deixaram-no em pequeno item no ambiente de trabalho. A menina Keira, que partilha dos mesmos ideais de beleza que eu (bela Bellucci…) ainda tem muito a aprender. Não gostei lá muito dela neste filme. Podia ter feito muito melhor, ainda por cima agora que a deixaram brincar com espadas e tudo. Espantosa esteve a Calipso (Naomi Harris) – aproveitem a rapariga para mais filmes – e também o senhor que fazia de Davy Jones (Bill Nighty) – um par romântico bem improvável (bela moral esta, o amor puxa-nos para o abismo e coisa e tal). E Geoffrey Rush, que representa maravilhosamente papéis em que está doido ou sujo ou ambos. Pena não ter havido mais exploração desta personagem, acho que não se perderia nada.

E os dois minutos de Keith Richards. Memorável, ver a inspiração e o produto no mesmo plano. How’s Mum? ;)

Tanta, tanta personagem. Aqueles lordes dos piratas inesquecíveis. Como é que podem dizer que na altura do Errol Flynn é que era? Coreografia das lutas de espadas? Corporalidade? Mas vocês, críticos, já viram mesmo um filme do Errol Flynn ou só estão a falar do que leram nos livros franceses sobre cinema? Porque eu gosto bastante de ver filmes do Flynn (ele é um dos meus guilty pleasures), e são muito engraçados, principalmente porque ele tem aquele riso específico 'ah ah ah', e põe a mão na anca, e finge que beija a Olivia de Havilland uma data de vezes, e pronto. Agora o Johnny Depp, não me façam falar do Johnny Depp...

Que dizer mais? O filme safou-se bem, ousou para além da americanice do filme previsível, e, mais importante que tudo (spoilers alert) matou o Orlando Bloom (end spoilers alert). E isso, meus amigos, nunca é pouco.

segunda-feira, maio 07, 2007

O Mistério da Estrada de Sintra (2007), Jorge Paixão da Costa


O melhor elogio que se pode fazer a este filme é comentar, ‘bolas, não parece nada português’. Meus caros amigos, passei horas e horas a comentar a fraca qualidade da fotografia cinematográfica em Portugal, para chegar este filme e desmentir-me à parvalhota. Lindo lindo lindo.


Depois o som. Vocês sabem como o som nos filmes portugueses costuma ser uma treta, tendo-se de recorrer constantemente às legendas para perceber a diarreia verbal que os actores vão tendo. Sempre me intriguei porque raio percebíamos tão bem as novelas e a treta de um filmezeco era tão complicado. Este filme utiliza o som dobrado, e por vezes nota-se, mas – meus caros amigos – a nitidez da compreensão sonora chega a um tal refinamento que julgamos estar perante um filme feito no estrangeiro.


Digamos de passagem que a história é bastante boa. Sempre achei que aquele grupinho de dandies que adorava andar à porrada com os românticos dava umas boas horas de entretenimento celulóidico. Pegar na génese da obra ‘O Mistério da Estrada de Sintra’ não é propriamente original se pensarmos a nível mundial (Shakespeare in Love, Amadeus, Relatório Kinsey... ) Mas dentro da ‘indústria’ portuguesa, penso que é insólito. E é bom reparar que temos tão bons temas inexplorados dentro das nossas parcas fronteiras.


Durante esta semana andei a berrar para quem me quisesse ouvir que os dois grandes problemas do cinema português são dois pontos a ausência de grandes planos e planos de pormenor (uma espécie de pudor em aproximar demasiado a câmara das coisas) e a falta de credibilidade dos actores a desempenharem os seus papéis.


Adoro ser contrariada nestas coisas. Este filme utiliza todos os planos e ângulos correntes do cinema comercial – já vou discutir isto do comercial mais à frente – e os actores, com excepção de uns secundários ocasionais, são tão bons nos seus papéis que agora quando imaginar o Eça de Queirós vou sempre ver o Ivo Canelas. E o António Pedro Cerdeira, que admiro há um certo tempo, está tão bom como o protagonista, mas fica educadamente em segundo plano. E a condessa, interpretada por Bruna di Tullio, argh, que linda e perfeita para o papel. Noto em Canelas sobretudo aquilo que ele uma vez disse num workshop sobre A Tempestade de Shakespeare, onde tive o prazer de participar – repetir as falas em todos os momentos até elas fazerem parte de nós e saírem naturalmente como se fossem nossas. Isto só para dizer que já estive na mesma sala que o Ivo Canelas. Nã nã nã nã nã, nã!


Li no Público, aquele reduto da crítica implacável (tenho a impressão que foi o Vasco Câmara que escreveu, mas não ponho as mãos no fogo), que isto era um novo Crime do Padre Amaro, feito para atrair as audiências, baseado em Eça de Queiroz que nos últimos tempos se tornou uma espécie de Jane Austen portuguesa (esta piada é minha, que os tipos não têm nível para dizer este tipo de coisas), e blá blá blá que treta de filme, buga dar só uma estrela e espetar 5 estrelas naquela cena do Tati, porque sobre ele já há livros e estudos editados há muito tempo.


Por vezes dou por mim a pensar que sou uma espécie de D. Quixote da crítica, a defender filmes que todos mandam abaixo, a mandar abaixo filmes que toda a gente exalta, e que qualquer dia estou eu a ir em direcção a um jantar romântico nas cantinas e sou brutalmente atirada das Monumentais abaixo. Hum, não é uma imagem bonita. Mas deixem-me mandar os meus lamirés irreflectidos enquanto o meu nome não andar pelas revistas cor-de-rosa: desde quando é que um filme tentar atrair público é pecado capital? E comparar com o Crime do Padre Amaro? Por Favor! Sim, está lá o Eça, está lá o sexo, estão lá os seios perfeitos das duas tipas, mas não estão lá os homossexuais, nem os gangs, nem a banda sonora dos Da Weasel ou outro grupo semelhante… nem a presença da nudez da actriz para compensar a falta de jeito da mesma para representar! Em verdade vos digo, saí muito feliz do cinema por pensar que há pessoas competentes no cinema em Portugal, e que talvez haja salvação para quando começar a trabalhar cá. E um filme com tantas referências históricas e literárias, será que podemos mesmo etiquetá-lo de comercial? Para mim, que não sou ninguém, não me canso de vos lembrar, é um delicioso exemplo de ‘meio-termo’ entre o telefilme para os putos de 12, 13 anos baterem umas pívias e o filme de inspiração oliveiresca com 5 planos e 4 horas para os intelectualóides se dedicarem a fantasias onanistas.


Vão ver. Ajudem a tornar este o filme português mais visto de sempre. Para limparmos as estatísticas e fazerem uma edição especial em DVD, e não desaparecer como é costume com os filmes bons feitos por cá…