segunda-feira, abril 02, 2007

Pecados Íntimos (2006), Todd Field




Finalmente fui ver esta coisa.

Era melhor do que eu pensava. O tom irónico de toda a história, em que ninguém se consegue enquadrar nas categorias normais bom/mau, a forma ousada de filmar (a ilustração de pormenores enumerados pelo narrador, por exemplo da descrição e comparação da mulher de Brad, Kathy, e a marginal Sarah interpretada por Kate Winslet; o plano-sequência temporal feito à borda da piscina) e um final que é pura e simplesmente brutal na sua fidelidade ao que costuma acontecer fora dos filmes.

Todas as personagens são brilhantes, não só nas suas características (à partida definidas por Tom Perrota, autor do livro) mas nas brilhantes interpretações que os actores fazem delas. Um ave muito especial para a senhora que interpreta a mãe do pedófilo, Phyllis Somerville, e para Kate Winslet (será porque a personagem dela é minha homónima? É uma possibilidade, mas a verdade é que a adoro). As cenas de sexo são tórridas e, ao mesmo tempo, com algo parecido com humor ou sarcasmo (a loucura em cima da máquina de lavar ou os vários planos evocados pela mente de Sarah enquanto discutem Madame Bovary no clube de leitura… )

E seria tão fácil convencer-nos que o pedófilo era um homem/criança arrependido… E quando o vemos sair com aquela estranha rapariga depressiva, julgamos que tudo irá acabar bem entre eles… Sol de pouca dura. Mas para quê um tarado apenas por filme quando se pode ter vários? O amigo de Brad, que preenche o tempo livre a torturar a paciência do pedófilo, em defesa dos bons costumes (ele que tem o passado manchado), é um maníaco que nos faz ter pena do coitado do molestador de criancinhas… No fim desejamos que lhe seja espetada uma faca no bucho. Ops, mais uma vez vemos as expectativas goradas.

É tão bom assistirmos a um fim tão imprevisível, em termos cinematográficos. Tudo caminha para outro lado. Mas as tragic flaws de cada uma das personagens estão presentes até ao fim, não há maneira de as coisas acontecerem em função de um happy ending forçado. Brad pura e simplesmente não quer crescer, não quer entrar na Ordem, não quer assumir a sua vontade de separação da mulher (afinal, eles são o casal perfeito, e Sarah é tão feia…). Sarah resolve vingar-se do hobby onanista do marido entrando numa aventura que segundo ela lhe mostra o que é estar viva, e no fim mostra-se demasiado frágil para lidar com a recusa. O pedófilo é afinal um Édipo; o maluquinho defensor dos bons costumes afinal até tem bom coração.

A subtileza do filme funciona tão deliciosamente bem, é tão refrescante… Sabe bem ver um filme destes de vez em quando. Há que admitir que lembra um bocado Beleza Americana de Allan Ball, mas menos macabro, definitivamente. Todd Field tem muito jeito para a coisa, sim senhor. Está contratado.


Sem comentários: