segunda-feira, agosto 13, 2007

20,13 (2006), Joaquim Leitão

Se bem que o Verão provoque em mim um estranho estado de mau-humor, garanto que não é por isso (ou não é só por isso) que as minhas pseudo-críticas por aqui se têm tornado tão parecidas com as que vocês podem ler por aí pelos jornais. Começo até a perceber esses senhores (se bem que nunca o vou admitir em frente a nenhum deles) – no fim de nos habituarmos a determinados padrões de qualidade, é difícil nos contentarmos com qualquer areiazinha para os olhos. Seja lá o que for um filme de qualidade…

Há uns tempos decidi que, uma vez que está na minha lista de coisas a fazer tornar-me uma realizadora de cinema mundialmente reconhecida e etcetera e tal, devia ver mais filmes nacionais, pra não dar uma de inculta em possíveis entrevistas com jornalistas cultos e para ter mestres que referir em discursos de agradecimento, de preferência o mais desconhecidos possível. Havendo o tal ciclo no TAGV, no qual tinha já visto o filme do Lynch, não quis deixar passar a oportunidade de ver o novo do Joaquim Leitão, naquela. Ok, não exactamente ‘naquela’. Foi mais para ver o Marco d’Almeida e conseguir decidir se ele é um bom actor ou um … actor bom. Na inexistência de pessoas superficial e futilmente bonitas nos meus ciclos próximos, tenho de, numa atitude pré-adolescente completamente confessa, idolatrar pessoas que vejo na televisão e em meios que tal.

Pronto, e lá fui ver o Marco d’Almeida. E meus caros amis, o rapaz é bastante engraçado, mas de repente, mal o filme começou, para mal dos meus pecados, as minhas hormonas silenciaram-se e o meu cérebro (ou seja lá o que for que está nesse sítio) falou mais alto. É bastante difícil tentar ignorar, por momentos que sejam, que me tornei irremediavelmente uma intelectualóide que estuda cinema, e em vez de me estar a babar para o maganão suado de farda, tive o azar de topar o quão mau era o filme. Bolas bolas bolas.

Primeiro que tudo, e tenho a impressão que contra um futuro eu falo, que merda de diálogos são aqueles? Se é de um filme realista que se trata, se calhar não faria mal os actores serem um bocado mais, sei lá, realistas? A única grande frase foi aquela ‘Escreva aí, senhor padre. Alzira… minha gande puta’. Quando vi o nome do produtor Tino Navarro entre os argumentistas, compreendi. Ou se calhar o mal estava já no Joaquim Leitão, que o Fernando Oliveira tão bem me lembrou, foi o autor da mais célebre frase do cinema português: ‘Vai à merda. – Vai tu.’ Isto, meus amigos, nem Shakespeare, porque se ele escrevesse assim a rainha tinha-lhe cortado a cabeça no fim da primeira peça.

Depois, a história em si. Não percebi bem qual era o objectivo, se é que havia um. Pelos vistos havia um mistério… Uh. Tinham assassinado um coitadito qualquer que andava metido com o comandante (estranhamente, o casal homossexual era o único que não parecia ter tendências homossexuais) – digo-vos que o deviam ter assassinado mais cedo, porque se ele diz duas frases no filme, são duas frases a mais, de tão deslocado que parecia ali (apresentar um número amador durante a guerra colonial não é a mesma coisa que fazer um concerto com os DZR’T, alguém lhe devia ter dito.) Depois, toda a situação de repetirem vezes sem conta as supostas ‘pistas’ – o número do cacifo, etc etc etc. Além do mais que não havia muita dúvida sobre quem era o weirdo ali (uma das melhores interpretações, a rapariga tem mesmo jeito pra coisa). ‘Então e qual é o versículo? – Versículo 20, linha 13. Vê aí: 20, 13.’ ‘Então e onde está o cacifo 20, 13? – O cacifo 20,13 está lá atrás, ninguém o quer’ – a vocês não sei, mas isto faz-me lembrar os textos da primária. É um insulto à inteligência do espectador, que vê episódios do CSI há bué e tem mais de 6 anos.

E as explosões, - mas que raio era aquilo??? E o trabalho de fotografia… Sim, geralmente os filmes portugueses pecam por estarem mal iluminados, tanto que uma pessoa nem percebe o que se passa. Mas ali… eu não estava lá, mas duvido que Moçambique, nos anos 60, no meio do mato, tivesse tanta luz como um campo de futebol… E quando vemos uma personagem com um candeeiro por cima, por que raio vem a luz de baixo? Duh?

Mais uma palavrinha para a banda sonora: eu gosto muito de música contemporânea. De algumas coisas. E de uma coisa tenho a certeza: duas notas repetidas ad nauseam, sempre as mesmas, em todas as situações e mais alguma, não é vanguarda nem pós-vanguarda (tanto mais que uma banda sonora deve estar subordinada ao filme, i.e., primeiro que tudo, ser funcional), é pura e simplesmente idiotice. (ih, estou mesmo má)

Quanto ao Marco d’Almeida, lá esteve. Não me pareceu nada de extraordinário. Mas o ser razoável em tal panorama já foi muito bom. Mas quem sou eu pra atirar postas de pescada, não é? Pois é.



I could never be your woman (2007), Amy Heckerling

Começo por dizer que me dói quando não posso tecer rasgados elogios a um chick flick, que, como sabem, é um género que tenciono defender um dia até à beira do abismo (um dos pequeninos). Inda mais quando era um filme que tinha tudo para ser alguma coisa de superior. Mas qual quê.

Amy Heckerling, fui consultar as cábulas internéticas, é a mesma realizadora que fez o ‘Olha quem Fala’ e o ‘Olha quem Fala Agora’. Lembram-se disso? Era giro, não era?

Ai, os problemas das mulheres maduras em andarem com jovenzinhos todos lindos… O star-system e as injustiças da televisão… A entrada na adolescência de rapariguinhas seguras de si… Cá para mim, não foi por falta de assuntos interessantes que o filme ficou um bocado ao lado. Deve ter sido por excesso.

Antes de destruir sem piedade um filme que já foi destruído por todos os críticos de cinema a sério deste país (o que me obrigou a pensar se não estarei a descair para o lado mau da Força), vou falar assim como quem não quer a coisa da tradução do título para português: ‘Nem Contigo nem Sem Ti’. Ora bem, para quem não sabe a tradução do título foi feita através de um concurso que a Lusomundo promoveu. Reparem bem: eles fizeram um concurso para um coitado ou coitada qualquer que nunca viu o filme traduzir o título. Porquê, pergunto eu? Desistiram de fazer seja o que for, incluindo traduzir títulos? Já põem a legendagem a cargo de programas informáticos – quando me lembro do ‘Dália Negra’ até me arrepio – mas que raio?

Ok, chega de cortar na empresa que um dia terei todo o prazer de destruir e vender aos pedacinhos. Vamos falar do filme. Como já referi, a abundância de assuntos exploráveis na trama fez com que nada fosse aprofundado. E mesmo em termos de progressão dramática – e puxo do mérito de ter já lido dois livros sobre o assunto – nem o dilema é bem explorado. Porque ninguém questiona o facto de ela andar com um rapaz mais novo. Estranhamente, ninguém questiona o facto de ela estar a ajudar esse mesmo rapaz mais novo a progredir na carreira. E quando ela acaba a relação, na cena seguinte está já no sofá debaixo dele.

Mesmo assim, para quem não tem mais ambições do que ver um romancezeco de matiné de sábado à tarde, até que entretém. Mas eu consigo entreter-me durante horas a olhar para o tecto e a pensar no quão horrenda e disforme sou, por isso não sei se o mero entretenimento pode justificar o tempo gasto a ver este filme, tempo esse que poderia ser muito melhor empregue a invadir a Polónia ou a perder a cabeça e entregar-se a um capitalismo desenfreado num qualquer centro comercial.

E quase não falei no filme. Também não sei que falar. Há algumas cenas boas – gosto especialmente do momento inoportuno em que a mãe dele lhe telefona, e as cenas com a filha são quase geniais – mas em contrapartida, não tenho bem a certeza daquela tipa gorda e imaginária, ambientalista extrema que prega morais em que ninguém acredita. E o genérico inicial, se bem que nojento e visceral, pareceu-me um pouco gratuito, já que não teve desenvolvimentos posteriores.

Por isso, ná.

domingo, agosto 05, 2007

Inland Empire, (2006), David Lynch

Começo o post por dizer que, ao contrário da maioria da minha geração, não sou uma admiradora fanática e cega do Sr. Lynch. Espero não ser mal interpretada – O Homem Elefante faz parte do meu top ten, adorei o Twin Peaks e aprecio bastante as estratégias narrativas do senhor.

E por isso tudo queria muito ver o Inland Empire. E aproveitando um ciclo naquele que é o único sítio em Coimbra que passa filmes não-comerciais, o TAGV, lá fui eu muito airosa. As expectativas eram altas – afinal o David filmou aquilo tudo em digital, gritando aos quatro ventos que aquilo era o futuro (o que o fez subir pontos incontáveis na minha escala de apreço pessoal), e pelo que diziam as pessoas por essa Internet fora a coisa estava extrema – ou se amava ou se odiava. Oba oba, eu adoro essas coisas.

Ora bem, filme visto, após dois dolorosos intervalos que quebraram completamente o ritmo da coisa (porque quando se está a meio de um estado subconsciente acordar estraga tudo), nem sei bem qual é a minha opinião sobre a coisa. Porque eu, que gosto de mandar lamirés sobre tudo e mais alguma coisa, mesmo naquelas áreas completamente fora da minha área de conhecimento (como é o caso do cinema), tenho opinião sobre tudo. Se for das chocantes, ainda melhor. Mas nada. Quer dizer…

Posso começar inocentemente por dizer que Inland Empire é um filme sobre representação, sobre o cinema em si, sobre uma data de coisas. E sem nexo narrativo nenhum. O que, para mim, até sabe bem de vez em quando, porque depois de ler livros e livros sobre guionismo a inocência de ‘oh, como será que isto acaba?’ desapareceu quase completamente. Numa história que não é história, podemos ir parar a milhentos sítios.

A senhora Laura Dern é fabulosa. Mas sobre isso não há dúvidas, pois não? Aliás, todas as personagens dos filmes de Lynch parecem… personagens dos filmes de Lynch. Ainda não decidi se isso é uma excelente qualidade autoral ou um defeito de falta de… como é que se diz originalidade de forma gratuitamente erudita?... não me lembro, o calor afecta-me imenso a pseudo-intelectualidade, lamento.

No início até parece que estamos a ver um filmezinho normal, um bocado estranho e tal, mas com um fio condutor. Para mim, os melhores momentos – aqueles que me levam ao delírio cinéfilo – são os dos coelhos gigantes. É de génio. Mas voltando à impessoalidade relativa da crítica, é impressionante como Lynch tira das imagens uma força enorme, tão grande que nem precisa de história para justificá-las. São deliciosamente retiradas de todo o contexto. O jogo com a noção real/ficção é extraordinário, tanto quanto mais eu ando com vontade de fazer uma brincadeira do género com os meus vídeos de verão.

E uma coisa que eu já tinha notado no Homem Elefante, sobretudo quando ele morre ao som do meu estimado Adágio for Strings do compositor americano Samuel Barber (e os anos que eu demorei a aprender estas coisitas de música? Upa upa) – Lynch é um maroto no que toca ao uso emocional da música. Talvez por ser o primeiro filme dele que eu vi numa sala de cinema mais ou menos a sério, com colunas decentes (?), vi que o enfant térrible faz um uso fabuloso da música. Inda por cima, de um senhor que eu até conheço – Penderecki – que é polaco e tudo. (eu ainda julgava que estava a ter alucinações sonoras, a pensar – hum, isto de música contemporânea soa tudo ao mesmo, mas afinal não ;))

De pontos menos positivos, tenho a impressão que o senhor Lynch, por vezes, cai no experimentalismo puro, aquele que eu também partilho por vezes, de – ‘vamos ver o que este efeito do programa de edição faz: ih, que giro, fica’. O problema se calhar é meu. E três horas de filme… ui, foi dose.

Mas quem sou eu para contestar o trabalho dele, né? E se até gostei a 80% do tempo, os outros 20% devem ser falha minha.

Ou não.