sexta-feira, novembro 23, 2007

Elizabeth: The Golden Age (2007), Shekhar Kapur

Ainda tive a tentação de fazer copy paste do veneno que destilei sobre este filme na edição d’A Cabra, mas depois pensei: bolas, pareço um crítico do Público, tenho de aprender a conter-me, senão ainda corro o risco de ser tomada por séria.

A maior desilusão do ano, para mim – o que é diferente de ser o pior filme do ano (tenho de começar a fazer esses tops anuais, para ver até que ponto consigo pensar com quilos e quilos de torta de Natal no estômago.). Pelo menos até agora. Falava-se de uma sequela a Elizabeth desde 2003, se não estou em erro. O projecto atrasou-se porque Blanchett mostrou-se reticente em voltar ao papel. Vendo o filme, percebo porquê. É terrível de se escrever, mas alguém tem de o fazer – que sequela desnecessária! Quase tão idiota como as do Matrix.

Lá estou eu outra vez a verter veneno. Deixem-me então poupar tempo precioso (está quase a começar a Letra L, dêem um desconto) e fazer o tal copy-paste:

Quase 10 anos após o sucesso de Elizabeth, Kapur volta a debruçar-se sobre uma das figuras mais fascinantes da história inglesa.
Se o primeiro filme fora descrito como um poderosíssimo ensaio sobre a dimensão claustrofóbica do poder absoluto, Elizabeth: A Idade do Ouro peca por não conseguir alcançar a complexidade de sentidos do seu predecessor. Sem medo de romancear factos, Kapur coloca uma Elizabeth (Cate Blanchett) envelhecida a debater-se entre os deveres reais – a traição de Mary Stuart, o iminente ataque espanhol - e o charme do pirata Walter Raleigh (Clive Owen). Durante o filme, não conseguimos deixar de pensar que toda a história não passa de um pretexto para ver Blanchett novamente em figurinos de época e para fazer paralelos visuais com ícones religiosos da Idade Média, insistindo ad nauseam na imagem da Rainha/Virgem Maria, rodeada de uma aura de santidade que simplesmente não funciona quando, sem qualquer tipo de ponte, é posta ao lado dos ciúmes terrivelmente humanos de Elizabeth a mulher.
Visualmente arrebatador – Kapur é sem dúvida um virtuoso da técnica -, é na fotografia e mise-en-scène que o filme mostra a sua força. Infelizmente, nem sempre o conteúdo acompanha a forma. Mesmo o momento alto do filme, a batalha naval (apresentada numa pertinente montagem paralela), não cumpre as expectativas épicas geradas: é curta e não sabe construir qualquer tipo de tensão. Mesmo Blanchett, no regresso ao papel que a confirmou como grande actriz, fica sufocada pela imensidão e luminosidade dos espaços em que se movimenta. Não mais a reflexão sobre o peso do poder: o que há neste filme é o melodrama barato em roupa de época ao jeito de Errol Flynn, um tratamento simplista do envelhecer da rainha, a queda em estereótipos demasiado fáceis – os fanáticos espanhóis saídos de um quadro de El Greco, uma Mary Stuart (Samantha Morton) ambiciosa e beata –, as frases grandiosas que ficam bem no trailer, e resta a pergunta: era mesmo necessário? 3/5

Que ruindade, não acham? Felizmente, por razões de espaço, não pude dizer tudo o que me ia na alma. Mas, uh lá lá, eis-me perante a folha branca interminável da Internet. O que é que falta dizer?

Não sei se quero falar das incongruências históricas do filme. Porque eu, por acaso, até que leio sobre a época Tudor desde os meus tenros 12 aninhos – e livros de historiadores e ensaios sobre desde os 14. As chamadas liberdades ficcionais são perfeitamente admissíveis, porque é de um filme que se trata, ora bolas, uma possível obra de arte. Ninguém manda e-mails ao Dali a dizer que os relógios são coisas bastante sólidas e não têm por hábito derreter (deve ser a má qualidade dos produtos espanhóis, digo eu…) Deixem-me só dizer que a primeira falha vem logo no título : a chamada Idade do Ouro isabelina começa depois da derrota da Armada Invencível, não antes. E chega de erudição não cinematográfica gratuita.

A banda sonora. O que é aquilo, deuses? (vejo na cábula imdbiana que o responsável pela coisa é um tal de Craig Armstrong). Um bocado desfasada, a armar ao épico moderno. Acalmem-se os meus quatro amis que vão ler isto: eu adoro épicos a armar ao pingarelho modernaço – veja-se a minha crítica de Marie Antoinette, que continuo a defender mesmo quando as bombas me caírem em cima. Mas esta música… se calhar o problema não é bem da música (e aí vai a private joke para aqueles que contactam comigo no mundo empírico: Temos de dar um desconto porque é de música… ) mas sim da junção da música à imagem. A sério, não consigo explicar melhor: os capa e espada à lá Merry England dos anos 40, só que com dollies, filtros e efeitos digitais.

Depois, eu continuo na minha: o Clive Owen tem os dentes demasiado brancos para fazer um pirata credível. Relembro os dentes de Geoffrey Rush não no Elizabeth original (porque o de ’98 era o original, este é a fotocópia com falta de tonner[1])[2] mas em A Paixão de Shakespeare. Aquilo sim, era uma dentadura isabelina. E já que falamos desse filme tão levezinho e no entanto recheado de pormenores deliciosos (basta dizer que um dos argumentistas foi Tom Stoppard, e se não sabem quem é este, google it!), acrescento que aí sim, uma rainha velha. Se o ataque espanhol foi em 1586, e o filme com Lady Judy Dench se passa em 1593, não acham que Blancehtt está demasiado bem conservada para uma mulher de 40 e tais anos, numa era em que – como lembrava a minha prof de História – não havia pasta de dentes ou aspirinas?

Pena tenho de não se terem decidido em explorar de forma decente os namoricos proibidos da Rainha, ou então fazerem um retrato decente do clima de conspiração. Aquela ideia da filha de Filipe II com a boneca de Elizabeth está genial – mas resultaria muito melhor como punch line para o espectador ao mesmo tempo que para o pai: perde a força porque é uma realidade que nos é apresentada poucos minutos depois do filme começar. A batalha naval não perderia nada em ser uns minutos mais longa – quiçá construir qualquer tensão/resolução – já que é (se calhar devia mandar o livro de guinismo ao sr. Kapur pelo correio – o Clímax. Ou, noutras palavras, porque estou numa de me soltar, o grande O do filme.

Não cai nenhum santinho se forem ver o filme – a não ser que vos impinjam uns óculos 3D de 1.50, ou tenham de pagar o bilhete normal sem nenhum tipo de desconto – aí têm o direito de se sentirem roubados. Mas se tiverem uma qualquer promoção TMN para aproveitar, ou desconto de Capitão Jovem, ou coisa assim, e principalmente se não tiverem visto o primeiro, não tendo assim qualquer ideia do bom que o sr. Kapur pode ser com um orçamento tão mais reduzido, até que é bom entretenimento. Mas também o é a masturbação e sai mais barata.[3]



[1] mais uma vez, uma dissimulada private joke, mas desta vez apenas duas pessoas vão perceber – ou seja, 50% dos leitores deste blog. É claro que este filme, apesar de eu o apelidar de fotocópia com falta de tonner, não tem um décimo do encanto do referendo a que a expressão se referia originalmente.
[2] Já repararam que desde que eu me apercebi que podia meter notas de rodapé nos posts não quero outra coisa?
[3] Pronto, estou claramente numa fase punk. Fuck the system.

A Outra Margem (2007), Luís Filipe Rocha

Fui ver este filme pelo triste facto que tinha de fazer a grelha para a Cabra e não estava numa onda de aturar Os Seis Sinais da Luz – era feriado, já tinha um Herzog na barriga, resolvi ir dar uma oportunidade ao cinema nacional. Medo? Muito, acrescentado pelo facto de ter lido a sinopse. Travestis? Homossexuais? Síndrome de Down? Meeeeedoooo….

Sim, muito aclamado lá fora (sei lá onde? Que garantias é que me dão que lá fora não são todos doidos?), prémios para Filipe Duarte (hum… o rapaz costuma safar-se bem), talvez até ficasse bem impressionada. Acresce-se o facto de que estes filmes portugueses saem em edições DVD de vinte exemplares, todos enviados para a Fnac do Chiado em Lisboa. (pois, porque eu queria partilhar a minha opinião sobre O Mistério da Estrada de Sintra com os meus amigos e cadê? Para piorar é o género de coisas que ninguém se preocupa em pôr nos circuitos ilegais internéticos…). Por fim, a Lusomundo – que todos sabem, pelo menos eu esforço-me para que saibam, tem uma óptima política de exibição em Coimbra -, uma semana após a estreia, resolveu pôr o filme numa única sessão diária, às 21.40. Numa cidade que tem uma sala ocupada pelos Robinsons – versão portuguesa há muito tempo (claro que para o Dr. Bacalhau são meros segundos), e duas salas para o Corrupção… bem, não é preciso escrever mais nada.

Mas fui, contra todas as expectativas. Gosto que se façam de difíceis comigo. (por acaso não, mas era uma piada fácil e não resisti). E contra todas as expectativas… gostei. Muito.

Primeiro – tem uma direcção de fotografia tão boa que dá vontade de chorar. E, ao contrário do que uma pessoa se tinha habituado na cinematografia nacional, tem direcção de actores. E a história… por estranho que pareça, conseguiu manter-se durante umas duas horas sem cair uma única vez no cliché. Oba oba. O que se pode pedir mais? A banda sonora, da autoria de (), serve às mil maravilhas. A cena inicial, em que vemos Filipe Duarte (essa nova esperança do cinema português, que já fez de tudo com todos, e que espero um dia ter o prazer de trabalhar com ele – graxa graxa graxa) travestido a cantar em playback uma música manhosa qualquer, desarma qualquer um. Bem, talvez não os homofóbicos.

Tudo o que vem depois – o conformar-se com a morte do namorado, o ir viver com a irmã e o sobrinho, a ex-noiva abandonada no altar – é contado de uma maneira muito simples, mas sem nunca cair em paradigmas televisivos ou telenovelescos. Já sabemos que Filipe Duarte será redimido pelo sobrinho ‘diferente’, mas surpreendermo-nos ao perceber que também o sobrinho ficará a ganhar com o contacto com o tio ‘esquisito’. A marginalidade de ser diferente, de estar na outra margem, também pode ser o melhor que nos aconteceu. E o que nos define enquanto pessoas.

Dá-me esperança que se falam filmes assim, simples e profundos, neste inferno cinematográfico à beira-mar plantado. Boa, Luís Filipe Rocha.

terça-feira, novembro 13, 2007

Rescue Dawn (2006), Werner Herzog


‘Espírito Indomável’, em português; como me explicou o Nando, uma tradução literal – rescue, espírito, dawn, indomável.

(vou tentar não começar a crítica com Ora)

Quem olha para a sinopse do filme (gentilmente oferecida pelo IMDB) e/ou para o trailer, está longe de imaginar que o realizador, alemão, Werner Herzog, é um ilustre membro do movimento ‘Neue Kino’, uma espécie de Nouvelle Vague para os boches. Outros ilustres membros do movimento foram R. M. Fassbinder (está a decorrer um ciclo sobre ele na Cinemateca Lisboeta – coitados daqueles que vivem na província, e não sabiam quem era o senhor quando houve um ciclo cá… snif snif) e o Wim Wenders, mais conhecido por ter feito a versão intelectualóide da Cidade dos Anjos, uns bons anos antes e intitulada Himmel über Berlin, ou em inglês, Wings of Desire. Para concluir a minha demonstração gratuita de intelectualidade e cultura geral apuradíssima acrescento que houve na altura uma coisa chamada Oberhausen Manifesto, a razão do cinema alemão se ter levantado das cinzas nos anos 70. Eu até dizia o que consta desse manifesto, mas comprei acções da Wikipedia e preciso de as ver render.

Tudo isto para dizer que este pode parecer mais um filme americano sobre a guerra no Vietname (até parece que estou a ouvir: MAIS UM???), mas não é. Ohhh. Mas parece.

Numa de confissões, e porque espero que quando atingir a celebridade os meus assistentes façam desaparecer no buraco negro internético estas baboseiras que debito regularmente, o único filme do Herzog que vi antes deste foi uma coisa… talvez deva escrever Coisa… chamada Hertz aus Glaz – sim, eu gosto de exibir o meu quase esquecido alemão – ou seja, Corações de Gelo. Não foi coisa que eu apreciasse por aí além, diga-se de passagem. Demasiado intelectual até para mim. Não há intelectualidade que resista à fraca qualidade VHS junto com um vídeo dos anos 70 e uma televisão dos 80. Mais tarde soube que este filme foi considerado por autoridades mais competentes como um dos mais ao lado do senhor Herzog, e senti-me feliz. Vou ter de dar outra oportunidade ao senhor, noutro dia de nevoeiro. Isto tudo para dizer que ao ver este filme esforcei-me por tentar ver o europeu intelectualóide por detrás das explosões.

Existem vários momentos em que Herzog cai nas suas marcas de autor (isto no sentido positivo da coisa) – lembro-me de dois: quando Dieter está a ser levado para o campo de prisioneiros de Laos e ouvimos a voice over: Os vivos têm os seus sonâmbulos e os mortos também (ou qualquer coisa do género), e depois, no fim, quando Dieter chega são e salvo ao seu barco, diz as palavras místicas: Esvaziem o que está cheio, encham o que está vazio… cocem onde tiverem comichão. Uma auto-ironia ao estilo Confucius says tão presente na obra de Herzog (pelo menos dizem que sim, que ele gosta de grandes frases aparentemente desprovidas de sentido)? É possível.

Um grande hip, hip, hurra para a banda sonora, a cargo do compositor Klaus Badelt e para o grande Actor Christian Bale, o Klaus Kinski de serviço, magríssimo, de um entusiasmo exasperante nos momentos mais improváveis, um plane freak com gostos culinários bastante peculiares. Não sei é o que a Sociedade Protectora dos Animais pode dizer sobre esses mesmos gostos…

A vegetação luxuriante da selva, a humidade que se sente mesmo quando a época das monções ainda não começou, o desempenho de Steve Zahn seguem de perto Bale e a Música. No fundo, no fundo, as únicas coisas que não me deixam sentir arrebatada pelo filme (se calhar o problema é meu, arrebato-me com as coisas erradas, tipo donuts com chocolate e relâmpagos) foram as concessões que Herzog fez ao american way of making movies – o ritmo da imagem (isso para mim até é positivo, já que pode servir de isco a gerações mais reticentes ao cinema de autor). Depois… hum, sei lá, a história tem um arzinho americano, mas não me posso esquecer que é baseada em factos reais, e se na realidade acabou bem, não iam deixar morrer o Dingler no fim só para me fazer a vontade.

Venham mais (deve ser dos poucos realizadores-velhos-mestres vivos que eu não tenho pena do facto). Com galinhas, que falharam a chamada para este.
(Pronto, Nando, acho que já corrigi tudo. Os pontos de interrogação estavam lá para alguma coisa...)

sexta-feira, novembro 02, 2007

Grindhouse - Planet Terror (2007), Robert Rodriguez


Para começar, deixem-me exprimir a minha enorme consternação por os senhores das grandes cooperativas que detém a distribuição dos filmes americanos no velho continente acharem que nós somos estúpidos demais para perceber o conceito da Grindhouse e, por ter resultado mal no país que viu nascer no seu jovem seio o fenómeno, resolveram partir a coisa ao meio e vendê-la aos fascículos para estes lados. Depois, dêem espaço para eu exprimir a minha enorme raiva por aquela coisa chamada Lusomundo que monopoliza a exibição nas salas portuguesas e que achou que o filme de Tarantino apenas interessava às pessoas das grandes metrópoles (incluindo estas grandes metrópoles Aveiro e excluindo Coimbra, que eu sempre desconfiei ser uma cidade de quarta categoria num país do Terceiro Mundo). Finalmente, vamos à minha pseudo-crítica.

Ora (que maneira tão pouco intelectual de começar uma crítica), o filme é mau. E é esse o objectivo. Por isso o filme é bom. Não na onda do ‘so bad it’s good’, mas na onda do puro mau, na celebração orgiástica (não onanista, como eu receava) do Mau em todo o seu esplendor. Não que eu seja um jovem rapaz americano nos seus 30 anos que passou a adolescência fechado em salas de série Z para que ninguém visse o acne alienígena que lhe cobria a cara. Não que eu tenha uma necessidade lésbica ardente de ver as longuíssimas pernas da McGowan. E houve milhões de piscadelas de olho que me passaram mais que ao lado. Mas gostei do filme (se bem que, entendido, isso não diga nada acerca do valor artístico do mesmo. Opiniões pessoais são para os cafés, não para análises e críticas cuidadas… F*CK OFF, voz intelectualóide dentro da minha cabeça!). Para mim é sobretudo um exercício de forma, e foi à espera disso que fui, e não fiquei desiludida. As falhas de película (houve mesmo pessoas a reclamar?? – se acham aquilo má qualidade deviam tentar ver as VHS da sala de cinema no meu vídeo dos anos 70…) não são assim tantas, os planos e movimentos de câmara estão bem feitos demais para série Z – e eu à espera de zooms e desfocagens à vídeo de férias... e nem uma perche intrometida em lado nenhum…), as explosões parecem reais, a ‘missing reel’ acontece no momento mais previsível (mas nem por isso deixa de nos fazer soltar uma risadinha perversa), e os actores… eh pá, tanta cara conhecida. Planet Terror é o que a série B, C e daí até à ZZZ (e aviso que não sou especialista, mas deve ser uma coisa muito divertida de ser) poderiam ter sido se tivessem dinheiro para isso. A nível técnico, bem entendido.

A nível de exploração de temas, narrativa e blá blá blá, aí é que está a homenagem à série B. Porque filme com mais clichés – propositados, leia-se - só mesmo o Team America. Aquele genérico inicial exageradíssimo e com o seu quê de mórbido – porque a maior parte dos espectadores já sabe o que vai acontecer a uma daquelas pernas lascivas, e intuímos que não vai ser bonito – desarma qualquer pessoa. Grita tanta sensualidade que esta desaparece no meio das risadinhas.

Grandes momentos? Ui, tantos. Nem me parece de bom tom estragar a surpresa a quem ainda não viu. Mas não resisto. Com licença. SPOILERS WARNING Um dos meus favoritos é quando Bruce Willis, afectado pela radiação, diz, com uma voz série, ‘I killed Bin Laden’. Depois o momento em que El Wray entra no hospital para salvar a miúda. Os zombies todos, lindos. (sugiro um novo filme de zombies português, em que o líder dos maus seria interpretado por Manoel de Oliveira e teria como nome de código Dr. Bacalhau. Vá, roubem-me a ideia, não me importo se tiver o prazer de ver tal coisa concretizada no grande ecrã). Também toda aquela cena em que Dakota Block que não consegue mexer as mãos. E chega END SPOILERS WARNING. Obrigado.

Vale a pena ver? Sim. Mas em condições diferentes: com a sessão dupla original, legendas em brasileiro, qualidade de imagem tipo ponto de cruz e um som do fundo do poço. Os americanos podem ter o Grindhouse… mas nós temos o dvd dos ciganos. Ah pois é![1]


[1] isto não é, de maneira nenhuma, uma defesa desses dvds vindos do inferno. Todo o filme merece ser visto nas melhores condições possíveis. É claro que o preço dos bilhetes de cinema e a política de exibição de uma certa empresa referida anteriormente não ajudam muito às nobres intenções…

segunda-feira, outubro 22, 2007

Rememering Kieslowski

Superbad, (2007), Greg Mottola


Se há coisa que tenha afastado mais gente de ver este filme – num país que delira com todos os seis (????) American Pies, desconfio que tenha sido a tradução brilhantemente ao lado do título – ‘Superbaldas’. Que é isto, meus deuses? Eles vêem os filmes antes de atirarem um título para as coitadas das bobinas (tadinhas)?

Eu própria, que desconfio estar-me a tornar numa snob de nariz empinado de primeira em relação a tudo o que tresande a comercialóide e/ou tenha o DiCaprio[1] a fazer de mauzão, tinha bastantes reticências em gastar o meu precioso capital financeiro a ver algo com um título tão brejeiro. Mas após alguns comentários entusiásticos de algumas pessoas, e também porque havia uma promoção a ser gasta e nada mais despertava o interesse, lá entrei.

A história é banal, muito americana: dois melhores amigos, quase a terminar o liceu e seguir para universidades diferentes, decidem arranjar álcool para uma festa onde estariam as duas raparigas da sua eleição, metendo-se nos mais incríveis sarilhos para conseguir levar a cabo tão arriscada missão. (os adjectivos ridículos são propositados) Como filme de lavar o cérebro, ou comédia juvenil, ou seja lá o que lhe queiram chamar, resulta muito bem. Os diálogos estão brilhantes, deliciosamente asneirentos e porcos – a personagem interpretada por … é sem dúvida uma das mais bem conseguidas, se bem que o nosso palhaço de eleição seja, por razões que me parecem óbvias demais para ser referidas, o famoso McLovin. (no intervalo ouvi uns comentários negativos de algumas raparigas das filas de trás, achando o filme com demasiadas referências ‘sujas’ ao acto sexual nas suas diversas variantes e extremamente misógino – é claro que elas não empregaram estas expressões de alto cariz universitário. Para mim, que vejo machismo em simples piropos, acho que elas não atingiram lá muito bem a fase conceptual do filme).

A banda sonora, que tem algo de viagem no tempo, dá uma cor de contraste interessante ao filme. Grandes momentos? Todas as cenas com os polícias chanfrados, os desvarios mentais de …, os créditos finais ornamentados com imagens de ‘portentosos falos’… Menos bom: algumas piadas fáceis, e um final que, visto um pouco à distância, passa uma sensação de angústia sobre o significado da amizade e do amor, e de qual estamos dispostos a abdicar mais facilmente.
[1] ex-paixão platónica assolapada da autora deste texto, que viu todos os trabalhos do menino de ouro de Hollywood e sex-symbol mesmo rodeado de cubos de gelo por todo o lado. Terá sido esse pequeno deslize hormonal que conduziu a autora ao interesse pelo cinema como arte, fazendo-a ver making ofs sobre making ofs e obrigando-a a abdicar da ideia de uma profissão segura e digna.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Os 10 da minha vida

(iniciativa do blog de Lauro António, http://10daminhavida.blogspot.com/)


Ora isto de top 10 é bastante complicado - ainda mais para alguém que desconhece por completo a noção de 'escolha'. Toda e qualquer lista de preferências que eu apresente é apenas.. hum... relativa ao meu estado de espírito neste momento em particular. Dito isto, aqui vamos:

1. Azul, Kieslowski

2. A.I. Artificial Intelligence, Spielberg


3. Big Fish, Tim Burton



4. O Pianista, Polanski


5. Jules et Jim, François Truffaut



6. Heaven, Tom Tykwer


7. O Homem Elefante, Lynch


8. Sunset Boulevard, Billy Wilder


9. Marie Antoinette, Sofia Coppola


10. Happiness, Todd Solondz





quinta-feira, outubro 04, 2007

Stardust (2007), Matthew Vaughn


Na lenta saída daquilo que aprendi recentemente designar-se por silly season (acrescente-se o desprezo que a Lusomundo vota às suas salas em Coimbra – cadê o Tarantino, cadê?), finalmente arranjei um filme para ir ver ao cinema. Stardust, de Matthew Vaughn (um realizador fresquinho) pareceu-me, entre todos aqueles cartazes que estão no Dolce a apanhar pó, alguns desde o início de Julho, um mal menor, quiçá até um bom início de temporada.

Ora bem, mais uma adaptação pós-Harry Potter, buga aproveitar a onda, já que os putos estão numa de aproveitar a onda, cenas de magia, confronto entre mundos, etc, etc. Vá, digam lá se estou enganada. Isto não significa que os filmes desta ‘moda’ sejam todos horrendos e desprezíveis, óbvio. Daqui a uns anos virá algum sociólogo estudar esta vaga de género, de certeza. (até aposto que apontará ao facto de, numa época em que dependemos de máquinas para tudo – bem, quase tudo – a magia surge ao ser humano como uma recentralização do poder no indivíduo, voltando a uma era pré-industrial mas com todos os confortos da modernidade, blá blá blá).

Ora, dizem-me os meus amigos da Wikipedia que o filme é uma adaptação do livro de 1998 com o mesmo título, da autoria de Neil Gaiman, que se deu com pessoas do calibre de Alan Moore e Dave Mckean e escreveu sobre aquele belíssimo livro que é o Hitchickers Guide to the Galaxy. Nunca li o Stardust, não me parece que tenha tempo nos próximos tempos para me lançar a tal coisa (a pilha de livros sobre cinema, jazz, neurologia, filosofia e música contemporânea já me proporciona uma sombra agradável por alguns meses. Por isso, sobre a qualidade do filme enquanto adaptação, nada posso dizer. Segundo um dos meus professores, como se tais questões fossem relevantes (ele nunca deve ter visto tanto filme a assassinar Shakespeare como eu vi numa recente fase da minha vida).

Primeiro: que belíssimo leque de estrelas num só filme!!! Ian McKellen a narrar, Michelle Pfeiffer, Robert DeNiro, Ricky Gervais, Peter O’Toole, Claire Danes… E um quase desconhecido, Charlie Cox (vi-o no Casanova e Mercador de Veneza – bem me parecia que a cara não era totalmente estranha) no papel principal. E bastante bem, diga-se. Aliás, o forte do filme são mesmo as personagens: Tristan, a bruxa Lamia, o Capitão Shakespeare (de longe a minha favorita – quando for grande também quero ser caçadora de relâmpagos; vejam em http://www.saricesartisticas.blogspot.com/).... e está bem filmado e tudo. Belíssimos planos, cores très jolies… A música não é nada de especial (que eu me lembre – também se há coisa que percebo menos do que música só cinema) – mas o que fica na cabeça de toda a gente quando sai do filme, cheio de efeitos especiais e momentos de genialidade, é ‘mas que raio é que falta para isto ser um grande filme? Porque falta alguma coisa!’

Eu adoraria saber que raio falta (isso poupar-me-ia flops pessoais futuros), mas só posso atirar barro à parede a ver se pega. Talvez porque a história é demasiado previsível (não sei se sou eu que sou especial – duvido – mas sabia sempre o que é que o herói ia usar para se livrar dos sarilhos), ou porque nunca acreditamos que a Estrela vai ficar sem coração, ou talvez, e isto é complicado, falta o amori. Isto é, se calhar o rapaz Vaughn não tenha feito o amor com a câmara (não num sentido literal, obviamente, que nojo). É tudo muito ‘vejam’, e para resultar devia ser ‘sofram!sintam!’; não consigo explicar melhor que isto, sorry.

Entre os grandes momentos de genialidade incluo: o pequeno hobby do Capitão Shakespeare, aquele gesto másculo e obsceno dos marinheiros, o ‘coro’ dos fantasmas dos irmãos, Ricky Gervais a fazer de Ricky Gervais (e como disse o Nando, é como o Woody Allen – resulta), a chacina dos irmãos, Claire Danes numa das mais intensas declarações de amor do ano dirigida a um rato (podiam criar uma nova categoria na Academia para contemplar estas coisas), o voodoo final, e a piadinha maldosa final do piscar de olhos entre o Capitão e o noivo de Victoria…

Momentos que poderiam ter sido feitos por mim ou por um dos meus colegas (no mau sentido) – que música de créditos finais é aquela, hã???

sexta-feira, setembro 28, 2007

Women on Film





Description: 80 years of female portraits in cinema - Mary Pickford, Lillian Gish, Gloria Swanson, Marlene Dietrich, Norma Shearer, Ruth Chatterton, Jean Harlow, Katharine Hepburn, Carole Lombard, Bette Davis, Greta Garbo, Barbara Stanwyck, Vivien Leigh, Greer Garson, Hedy Lamarr, Rita Hayworth, Gene Tierney, Olivia de Havilland, Ingrid Bergman, Joan Crawford, Ginger Rogers, Loretta Young, Deborah Kerr, Judy Garland, Anne Baxter, Lauren Bacall, Susan Hayward, Ava Gardner, Marilyn Monroe, Grace Kelly, Lana Turner, Elizabeth Taylor, Kim Novak, Audrey Hepburn, Dorothy Dandridge, Shirley MacLaine, Natalie Wood, Rita Moreno, Janet Leigh, Brigitte Bardot, Sophia Loren, Ann Margret, Julie Andrews, Raquel Welch, Tuesday Weld, Jane Fonda, Julie Christie, Faye Dunaway, Catherine Deneuve, Jacqueline Bisset, Candice Bergen, Isabella Rossellini, Diane Keaton, Goldie Hawn, Meryl Streep, Susan Sarandon, Jessica Lange, Michelle Pfeiffer, Sigourney Weaver, Kathleen Turner, Holly Hunter, Jodie Foster, Angela Bassett, Demi Moore, Sharon Stone, Meg Ryan, Julia Roberts, Salma Hayek, Sandra Bullock, Julianne Moore, Diane Lane, Nicole Kidman, Catherine Zeta-Jones, Angelina Jolie, Charlize Theron, Reese Witherspoon, Halle Berry

quinta-feira, setembro 27, 2007

The Simpsons, (2007), David Silverman


Spider Pig, Spider Pig...

(começo por pedir desculpa por ter entrado numa de silly season e morrido para a aldeia virtual durante as férias)

Os Simpsons são um fenómeno. Acho que não há dúvidas a respeito disso. Tantos anos a fazerem as delícias amarelas dos viciados em televisão, a retratarem a família americana deliciosamente disfuncional, com aqueles créditos iniciais sempre diferentes, os episódios especiais de Halloween e Natal (muitos deles realizados pelo senhor Silverman), as piadas politicamente incorrectas (mas de uma maneira bem mais subtil que o South Park ou o Family Guy), e no fim de esperar tanto tempo por um filmezinho da coisa, a expectativa era tudo menos alta. Sabem, é aquela coisa, o próprio Groening admitiu estar à espera que as audiências da série descessem para avançar com o filme. E elas não desciam.

Mas esquecendo por momento todo o contexto sócio-cultural-histórico da coisa, passo para o filme como objecto de arte autónomo e etecetera e tal (um conceito um bocado estranho, já que na minha opinião quase tudo se resume ao humor dos críticos – não que devesse ser assim). Ora o filme foi violentamente acusado de ser um episódio da série esticado para uma hora e meia. Hum. Pensemos um bocado. De que maneira peregrina o filme poderia não o ser? Porque os episódios dos Simpsons seguem uma estrutura narrativa clássica (mais ou menos), tal como a maioria dos filmes-pipoca e mesmo alguns filmes-chazinho-e-scones (isto não é bem da minha autoria, é um conceito que surgiu com as art-houses americanas, o que prova que eu até ando a aprender umas coisas enquanto me passeio pelo curso). ‘Ah, e tal, o filme só faz sentido para quem for fã da série’. Hum. Sim, é verdade. Também acho que poderá captar alguns espectadores para a série. Mas isso é como tudo. Que sentido faz ir ver o filme dos Simpsons se não se for fã da série? Eu não fui ver os Transformers por essa razão. E apelar aos fãs já é muito bom (veja-se caso Harry Potter, em que a maioria dos ‘fãs-puros’, i.e., aqueles que leram os livros primeiro, não vão à bola com os filmes).

Esta verborreia virtual toda para dizer que The Simpsons: The Movie é um bom filme, desde que se seja fã da série e não se tenha o mesmo grau de humor que os espectadores dos pouco saudosos programas de candid camera. E um certo grau de cultura cinematográfica. Não aquela que os profs dos cursos de cinema pedem, mas aquela que o pessoal que vê filmes na televisão no fim-de-semana adquire naturalmente. Porque tal como os episódios, há tanta piscadela de olho que nem sei por onde começar. (Senhor dos Anéis, Titanic, vida pessoal do Exterminador Implacável…).

A história, que se desenvolveu a partir da premissa ‘Homer apaixona-se por um porco’ é bastante boa, porque além de ser divertida, joga com as características das personagens (Bart a querer ser adoptado por Flanders, Lisa com um namorado não-imaginário, Marge a querer pôr fim ao casamento). Forçado? Arrastado? Onde?

Os meus farabéns lambidos ao senhor compositor Hans Zimmer, que fez uma banda sonora brilhante a partir do tema de Elfman e que criou a primeira música com menos de 70 segundos a chegar ao top britânico: a versão coral do genial Spider Pig, que se entranha na nossa mente e nos obriga a tautear nas ocasiões mais impróprias. Vendo o passado do senhor Zimmer, vejo que outros trá-lá-lás dele incluem a segunda e terceira parte dos Piratas das Caraíbas, Madagáscar, O Último Samurai, Pearl Arbor, Gladiator, O Rei Leão, Thelma and Louise… uffff!!!!

Melhores momentos: Lisa a contar à mãe do rapaz irlandês, Bart e o chocolate quente de Flanders, Homer e a Boob Lady, todas as cenas em que aparece o porco, a chegada ao Alaska, etc etc etc, e os créditos finais, em que se tem de ficar MESMO ATÉ AO FIM para valer a pena.

Coisas más? A Lisa e o Sr. Burns não aparecem tanto como eu gostaria….Snif snif

Sequel?’

segunda-feira, agosto 13, 2007

20,13 (2006), Joaquim Leitão

Se bem que o Verão provoque em mim um estranho estado de mau-humor, garanto que não é por isso (ou não é só por isso) que as minhas pseudo-críticas por aqui se têm tornado tão parecidas com as que vocês podem ler por aí pelos jornais. Começo até a perceber esses senhores (se bem que nunca o vou admitir em frente a nenhum deles) – no fim de nos habituarmos a determinados padrões de qualidade, é difícil nos contentarmos com qualquer areiazinha para os olhos. Seja lá o que for um filme de qualidade…

Há uns tempos decidi que, uma vez que está na minha lista de coisas a fazer tornar-me uma realizadora de cinema mundialmente reconhecida e etcetera e tal, devia ver mais filmes nacionais, pra não dar uma de inculta em possíveis entrevistas com jornalistas cultos e para ter mestres que referir em discursos de agradecimento, de preferência o mais desconhecidos possível. Havendo o tal ciclo no TAGV, no qual tinha já visto o filme do Lynch, não quis deixar passar a oportunidade de ver o novo do Joaquim Leitão, naquela. Ok, não exactamente ‘naquela’. Foi mais para ver o Marco d’Almeida e conseguir decidir se ele é um bom actor ou um … actor bom. Na inexistência de pessoas superficial e futilmente bonitas nos meus ciclos próximos, tenho de, numa atitude pré-adolescente completamente confessa, idolatrar pessoas que vejo na televisão e em meios que tal.

Pronto, e lá fui ver o Marco d’Almeida. E meus caros amis, o rapaz é bastante engraçado, mas de repente, mal o filme começou, para mal dos meus pecados, as minhas hormonas silenciaram-se e o meu cérebro (ou seja lá o que for que está nesse sítio) falou mais alto. É bastante difícil tentar ignorar, por momentos que sejam, que me tornei irremediavelmente uma intelectualóide que estuda cinema, e em vez de me estar a babar para o maganão suado de farda, tive o azar de topar o quão mau era o filme. Bolas bolas bolas.

Primeiro que tudo, e tenho a impressão que contra um futuro eu falo, que merda de diálogos são aqueles? Se é de um filme realista que se trata, se calhar não faria mal os actores serem um bocado mais, sei lá, realistas? A única grande frase foi aquela ‘Escreva aí, senhor padre. Alzira… minha gande puta’. Quando vi o nome do produtor Tino Navarro entre os argumentistas, compreendi. Ou se calhar o mal estava já no Joaquim Leitão, que o Fernando Oliveira tão bem me lembrou, foi o autor da mais célebre frase do cinema português: ‘Vai à merda. – Vai tu.’ Isto, meus amigos, nem Shakespeare, porque se ele escrevesse assim a rainha tinha-lhe cortado a cabeça no fim da primeira peça.

Depois, a história em si. Não percebi bem qual era o objectivo, se é que havia um. Pelos vistos havia um mistério… Uh. Tinham assassinado um coitadito qualquer que andava metido com o comandante (estranhamente, o casal homossexual era o único que não parecia ter tendências homossexuais) – digo-vos que o deviam ter assassinado mais cedo, porque se ele diz duas frases no filme, são duas frases a mais, de tão deslocado que parecia ali (apresentar um número amador durante a guerra colonial não é a mesma coisa que fazer um concerto com os DZR’T, alguém lhe devia ter dito.) Depois, toda a situação de repetirem vezes sem conta as supostas ‘pistas’ – o número do cacifo, etc etc etc. Além do mais que não havia muita dúvida sobre quem era o weirdo ali (uma das melhores interpretações, a rapariga tem mesmo jeito pra coisa). ‘Então e qual é o versículo? – Versículo 20, linha 13. Vê aí: 20, 13.’ ‘Então e onde está o cacifo 20, 13? – O cacifo 20,13 está lá atrás, ninguém o quer’ – a vocês não sei, mas isto faz-me lembrar os textos da primária. É um insulto à inteligência do espectador, que vê episódios do CSI há bué e tem mais de 6 anos.

E as explosões, - mas que raio era aquilo??? E o trabalho de fotografia… Sim, geralmente os filmes portugueses pecam por estarem mal iluminados, tanto que uma pessoa nem percebe o que se passa. Mas ali… eu não estava lá, mas duvido que Moçambique, nos anos 60, no meio do mato, tivesse tanta luz como um campo de futebol… E quando vemos uma personagem com um candeeiro por cima, por que raio vem a luz de baixo? Duh?

Mais uma palavrinha para a banda sonora: eu gosto muito de música contemporânea. De algumas coisas. E de uma coisa tenho a certeza: duas notas repetidas ad nauseam, sempre as mesmas, em todas as situações e mais alguma, não é vanguarda nem pós-vanguarda (tanto mais que uma banda sonora deve estar subordinada ao filme, i.e., primeiro que tudo, ser funcional), é pura e simplesmente idiotice. (ih, estou mesmo má)

Quanto ao Marco d’Almeida, lá esteve. Não me pareceu nada de extraordinário. Mas o ser razoável em tal panorama já foi muito bom. Mas quem sou eu pra atirar postas de pescada, não é? Pois é.



I could never be your woman (2007), Amy Heckerling

Começo por dizer que me dói quando não posso tecer rasgados elogios a um chick flick, que, como sabem, é um género que tenciono defender um dia até à beira do abismo (um dos pequeninos). Inda mais quando era um filme que tinha tudo para ser alguma coisa de superior. Mas qual quê.

Amy Heckerling, fui consultar as cábulas internéticas, é a mesma realizadora que fez o ‘Olha quem Fala’ e o ‘Olha quem Fala Agora’. Lembram-se disso? Era giro, não era?

Ai, os problemas das mulheres maduras em andarem com jovenzinhos todos lindos… O star-system e as injustiças da televisão… A entrada na adolescência de rapariguinhas seguras de si… Cá para mim, não foi por falta de assuntos interessantes que o filme ficou um bocado ao lado. Deve ter sido por excesso.

Antes de destruir sem piedade um filme que já foi destruído por todos os críticos de cinema a sério deste país (o que me obrigou a pensar se não estarei a descair para o lado mau da Força), vou falar assim como quem não quer a coisa da tradução do título para português: ‘Nem Contigo nem Sem Ti’. Ora bem, para quem não sabe a tradução do título foi feita através de um concurso que a Lusomundo promoveu. Reparem bem: eles fizeram um concurso para um coitado ou coitada qualquer que nunca viu o filme traduzir o título. Porquê, pergunto eu? Desistiram de fazer seja o que for, incluindo traduzir títulos? Já põem a legendagem a cargo de programas informáticos – quando me lembro do ‘Dália Negra’ até me arrepio – mas que raio?

Ok, chega de cortar na empresa que um dia terei todo o prazer de destruir e vender aos pedacinhos. Vamos falar do filme. Como já referi, a abundância de assuntos exploráveis na trama fez com que nada fosse aprofundado. E mesmo em termos de progressão dramática – e puxo do mérito de ter já lido dois livros sobre o assunto – nem o dilema é bem explorado. Porque ninguém questiona o facto de ela andar com um rapaz mais novo. Estranhamente, ninguém questiona o facto de ela estar a ajudar esse mesmo rapaz mais novo a progredir na carreira. E quando ela acaba a relação, na cena seguinte está já no sofá debaixo dele.

Mesmo assim, para quem não tem mais ambições do que ver um romancezeco de matiné de sábado à tarde, até que entretém. Mas eu consigo entreter-me durante horas a olhar para o tecto e a pensar no quão horrenda e disforme sou, por isso não sei se o mero entretenimento pode justificar o tempo gasto a ver este filme, tempo esse que poderia ser muito melhor empregue a invadir a Polónia ou a perder a cabeça e entregar-se a um capitalismo desenfreado num qualquer centro comercial.

E quase não falei no filme. Também não sei que falar. Há algumas cenas boas – gosto especialmente do momento inoportuno em que a mãe dele lhe telefona, e as cenas com a filha são quase geniais – mas em contrapartida, não tenho bem a certeza daquela tipa gorda e imaginária, ambientalista extrema que prega morais em que ninguém acredita. E o genérico inicial, se bem que nojento e visceral, pareceu-me um pouco gratuito, já que não teve desenvolvimentos posteriores.

Por isso, ná.

domingo, agosto 05, 2007

Inland Empire, (2006), David Lynch

Começo o post por dizer que, ao contrário da maioria da minha geração, não sou uma admiradora fanática e cega do Sr. Lynch. Espero não ser mal interpretada – O Homem Elefante faz parte do meu top ten, adorei o Twin Peaks e aprecio bastante as estratégias narrativas do senhor.

E por isso tudo queria muito ver o Inland Empire. E aproveitando um ciclo naquele que é o único sítio em Coimbra que passa filmes não-comerciais, o TAGV, lá fui eu muito airosa. As expectativas eram altas – afinal o David filmou aquilo tudo em digital, gritando aos quatro ventos que aquilo era o futuro (o que o fez subir pontos incontáveis na minha escala de apreço pessoal), e pelo que diziam as pessoas por essa Internet fora a coisa estava extrema – ou se amava ou se odiava. Oba oba, eu adoro essas coisas.

Ora bem, filme visto, após dois dolorosos intervalos que quebraram completamente o ritmo da coisa (porque quando se está a meio de um estado subconsciente acordar estraga tudo), nem sei bem qual é a minha opinião sobre a coisa. Porque eu, que gosto de mandar lamirés sobre tudo e mais alguma coisa, mesmo naquelas áreas completamente fora da minha área de conhecimento (como é o caso do cinema), tenho opinião sobre tudo. Se for das chocantes, ainda melhor. Mas nada. Quer dizer…

Posso começar inocentemente por dizer que Inland Empire é um filme sobre representação, sobre o cinema em si, sobre uma data de coisas. E sem nexo narrativo nenhum. O que, para mim, até sabe bem de vez em quando, porque depois de ler livros e livros sobre guionismo a inocência de ‘oh, como será que isto acaba?’ desapareceu quase completamente. Numa história que não é história, podemos ir parar a milhentos sítios.

A senhora Laura Dern é fabulosa. Mas sobre isso não há dúvidas, pois não? Aliás, todas as personagens dos filmes de Lynch parecem… personagens dos filmes de Lynch. Ainda não decidi se isso é uma excelente qualidade autoral ou um defeito de falta de… como é que se diz originalidade de forma gratuitamente erudita?... não me lembro, o calor afecta-me imenso a pseudo-intelectualidade, lamento.

No início até parece que estamos a ver um filmezinho normal, um bocado estranho e tal, mas com um fio condutor. Para mim, os melhores momentos – aqueles que me levam ao delírio cinéfilo – são os dos coelhos gigantes. É de génio. Mas voltando à impessoalidade relativa da crítica, é impressionante como Lynch tira das imagens uma força enorme, tão grande que nem precisa de história para justificá-las. São deliciosamente retiradas de todo o contexto. O jogo com a noção real/ficção é extraordinário, tanto quanto mais eu ando com vontade de fazer uma brincadeira do género com os meus vídeos de verão.

E uma coisa que eu já tinha notado no Homem Elefante, sobretudo quando ele morre ao som do meu estimado Adágio for Strings do compositor americano Samuel Barber (e os anos que eu demorei a aprender estas coisitas de música? Upa upa) – Lynch é um maroto no que toca ao uso emocional da música. Talvez por ser o primeiro filme dele que eu vi numa sala de cinema mais ou menos a sério, com colunas decentes (?), vi que o enfant térrible faz um uso fabuloso da música. Inda por cima, de um senhor que eu até conheço – Penderecki – que é polaco e tudo. (eu ainda julgava que estava a ter alucinações sonoras, a pensar – hum, isto de música contemporânea soa tudo ao mesmo, mas afinal não ;))

De pontos menos positivos, tenho a impressão que o senhor Lynch, por vezes, cai no experimentalismo puro, aquele que eu também partilho por vezes, de – ‘vamos ver o que este efeito do programa de edição faz: ih, que giro, fica’. O problema se calhar é meu. E três horas de filme… ui, foi dose.

Mas quem sou eu para contestar o trabalho dele, né? E se até gostei a 80% do tempo, os outros 20% devem ser falha minha.

Ou não.

sexta-feira, julho 27, 2007

Shrek The Third (2007), Chris Miller

Mais uma vez, a terceira parte de uma sequela.
Porque é que não ficaram pela segunda parte, porquê, porquê, porquê?
Se há filme com tanto ar de ter sido feito à pressão para aproveitar a onda, é este. É demasiado curto, as piadas não tem piada suficiente, não há nenhuma personagem nova que faça o que o Gato das Botas fez pelo segundo, não há nenhuma música que fique no ouvido... Resumindo, é melhor esquecermos que este filme aconteceu.
Bolas, é a primeira vez que estou a falar mal de um filme. Deve ser do calor, põe-me mal-disposta.
Deturpar contos de fadas é uma coisa maravilhosa. A ideia do feioso ficar com a princesa, então, é fantástica. Por isso o primeiro foi tão bom (isso e o Burro). Depois, e que tal o feioso ir conhecer os sogros + uma caricatura do Banderas interpretada pelo próprio Banderas (com os olhinhos ternurentos ui ui ui) - ainda resultou melhor. E agora o que temos? A Fiona grávida + a procura de um sucessor ao trono (toda uma temática de aceitar responsabilidades)+ o nerd do liceu torna-se rei + o mau fica com o trono para os maus da fita+ uma revolução feminista... Muita areia para o camiãozinho? Se calhar...

Bons momentos (deixem-me rebuscar na memória, isto de escrever críticas muito tempo depois não vai com nada): a piscadela de olho aos Monty Phyton logo no início, o Gato preso no corpo do Burro a tentar seduzir os guardas, o Eric Idle ;) e não estou a ver mais nada.
Resumindo, mais valia ter esperado que passasse na televisão, mas agora já vou tarde...

quinta-feira, julho 26, 2007

Harry Potter and the Order of the Phoenix (2007), David Yates

Antes de começarmos a crítica, deixem-me avisar: sou fã do tipo da cicatriz desde que o primeiro livro foi publicado em português. Continuemos então.



Ah, o quinto livro, o maior livro dos sete, uh, e há mortes e mais mortes, coitados dos meninos que julgam que isto é literatura infantil. Porque não é.


O problema das adaptações é que, quanto mais gostamos do livro, menos achamos que o filme lhe faz justiça. Da saga Potter, o único filme que escapa um bocadinho à maldição é o terceiro, dirigido pelo senhor Cuaron. E tenho muita pena de toda a gente que julga que seguir a moda Potter é ver os filmes e pronto. Nem sabem o que estão a perder.


Neste, o senhor Yates teve ainda outro problema. Com tanta história pra resumir em duas horas e meia, não podia perder muito tempo com coisas supérfluas para o decorrer da história, mas importantíssimas para os fãs - tipo os atrofios da Harry com a Cho, e toda a aura de mistério à volta do Neville...


Estou a escrever neste momento sabendo exactamente como acaba a saga. (Yeh) Passar os livros pra filme logo logo terá sido uma boa ideia? O Senhor dos Anéis teve de esperar décadas até surgir alguém capaz de fazer uma adaptação decente. E nem vou falar do Código Da Vinci, que na minha humilde opinião de pessoa que não percebe nada do assunto, não vale o papel em que está escrito.


Mesmo assim, é um bom filme para os fãs dos livros, se eles resolverem esquecer por um bocadinho como as coisas realmente acontecem. (e em cada livro são pormenores e pormenores a aumentar) Para os outros, não sei se será boa ideia. Aliás, eu como fã fiquei com a sensação de que, ya, está bem filmado, coiso e tal, mas falta qualquer coisa... não sei o quê. Dá-me a impressão que nenhum dos realizadores é um verdadeiro Potter fan, e filmam tudo ao 'frete' (notícias de última hora, o meu pai foi ver o filme e não percebeu nada. Acrescente-se que só viu dois dos 5 e ficou a julgar que o Voldemort era pai do Harry - devem ser resquícios do Star Wars, sei lá...)
E agora um momento fútil:

Radcliffe, esse penteado... ná. Agora que temos a certeza que tu até tens jeito para a coisa - e ficas tão melhor quando não estás a fazer de Harry Potter - mal podemos esperar para te ver noutro tipo de coisas. Rupert - és tão deliciosamente ruivo... Emma Watson - ainda não percebi se a Hermione fica tão irritante nos filmes porque és boa actriz ou se é exactamente pela razão oposta...


Fica mal eu dizer o quanto adoro ver o Alan Rickman a fazer de Snape? E o Gary Oldman a fazer da minha personagem preferida, o Sirius? (acrescente-se que o momento dramático do filme não teve assim lá muito dramatismo) E a perversa personagem da Umbridge, brilhantemente interpretada pela Imelda Staunton, que já nos tinha provado o boa actriz que é em Vera Drake?Ná, eu digo o que me apetece.
A banda sonora, para variar, é qualquer coisa. Aquele leitmotiv... Nicholas Hooper pode não ser o Danny Elfman, mas safa-se. (é evidente que se eu o quiser comparar ao Jonh Williams ou ao Morricone torna-se ridículo, o coitado do rapaz - temos de dar um desconto que é de música)
Bem, mais um filme do Harry Potter. O próximo também a cargo de Yates, o último - dizem - a cargo de Shyamalan (oba, escrevi bem o nome à primeira). Para mim, deviam era contratar o Burton, mas isso é só a minha opinião...

quinta-feira, julho 19, 2007

Ocean's Thirteen, (2007), Steven Soderbergh

Tenho de confessar, mes amis, que já fui ver este filme há muito tempo, mas a minha suposta educação superior não me deixou muito tempo livre nos últimos tempos...

Ora bem. A terceira parte de uma sequela. Oba oba. Tenho de confessar que nem o segundo fui ver, e só fui ver este porque... bem, vocês já viram o que tem estado no cinema ultimamente? Argh.
E não é que até gostei bastante da coisa? Para blockbuster até que teve monentos bem out - citemos Clooney a chorar a ver o show da Oprah ou o telemóvel de Pitt a tocar nos momentos mais inoportunos.
Toda uma estética de filmes foleiros dos anos 80 - a nivel de enquadramento, intertítulos, etc etc etc, (embora felizmente não tenha descambado para penteados à anos 80), assim como o extremar do género - ui - fizeram algo fantástico: ao descambar propositadamente para o 'kitch', aquilo virou 'camp'. Nem toda a gente percebeu este toque de genialidade do Soderbergh, mas é para isso que eu aqui estou, para ver coisas estranhíssimas onde ninguém vê nada.
Óptimo o confronto Al Pacino vs. Clooney, o nariz do Matt Dammon, a banda sonora (esperem, deixem-me ir sacar isso, agora que me lembro) do senhor David Holmes, e mais uma data de coisas que eu não me lembro.
Valeu a pena? Sim, valeu a pena. Inda mais que agora eu nem vejo televisão...

segunda-feira, maio 28, 2007

Piratas das Caraíbas 3: Nos Confins do Mundo (2007), Gore Verbinski


E a trilogia chega ao fim. Aquilo que começara como um filme manhoso baseado numa atracção da DisneyWorld e com uma personagem central bastante dúbia, e acabou como um dos mais inesperados sucessos de bilheteira (dando origem à inevitável sequela… isto tem sido um ano de sequelas, que coisa…) acabou. Espero que definitivamente (porque estes tipos de Hollywood nunca sabem quando parar, … um Rocky Balboa? Um Rambo IV? Um Die Hard IV?), porque o que vier mais, para mim, é mais provável estragar do que sublimar. Digo eu.

Ora, se eu fosse uma crítica de cinema à séria (que não sou: basta saber quem é o Jonh Cameron Mitchell para não arranjar emprego em nenhum jornal...) começava já por deitar abaixo o filme, porque o vi numa sala cheia de gente e pipocas em stereo (já era altura de alguém usar esse barulho irritante nalgum pedaço de música electroacústica…) e toda a gente gostou quando saiu. Eu, do alto da minha superioridade de crítica, que tem em casa DVDs da Critterion Collection e acha que não se faz cinema decente desde os anos 60, diria que é uma história cheia de trapalhadas, para ‘encher chouriços’ (expressão gira, tenho de a usar mais vezes), e que francamente se o um nem era grande espingarda como objecto fílmico digno de fazer parte da Sagrada História dos Filmes Artisticamente Onanistas (porque só dão prazer ao seu próprio autor) que os críticos a sério adoram confundir com a brejeira história do cinema puro e duro e cheio de nhanha de pipocas (é assim que se escreve ‘nhanha’? ignoro). Ah… que desperdício de película, diria eu se fosse uma verdadeira interessada do cinema. Por isso é que a arte está como está, só se vê porcarias… Uma história de piratas? Nada poderia estar mais longe do Errol Flynn do que aquele mariconço do Johnny Depp, etc etc etc.

Infelizmente para mim (que não consigo fingir que não gosto de alguma coisa só para dar ar de cool), achei o filme bastante bom. É claro que o primeiro foi a surpresa, o segundo tinha demasiado Orlando Bloom no ecrã para eu poder ver o filme em condições (ele estava sempre à frente do filme, que horror!), mas este… um bom final, bastante digno, blockbuster confesso e sem vergonha disso, bastante ciente que se não houvesse Jack Sparrow tinha sido um flop, e a segurança de que todos iriam correr às salas mal estreasse (e a vossa anfitriã não foi excepção), deu azo a que Verbinski se desse ao luxo (com a ajuda do budget, é claro) de colocar as cenas mais out de que me lembro de haver num blockbuster. Tão out que receei, quando as vi, de que o público fedorento e pipoqueiro que me rodeava por todos os lados, tipo CO2 em hora de ponta, explodisse em raiva, matasse o projeccionista e fizesse vestidos avant-garde da tela. (estou a escrever muito e ainda não disse nada sobre o filme, eu sei. Temos pena. O blog é meu, escrevo o que me apetecer…) Mas não é que o público gostou? Muito mesmo? Tenho de começar a pensar na hipótese assustadora que o público de cinema não é tão estúpido quanto certos resultados de top box-office querem fazer parecer…

Comecemos do início. Há um pequeno problema com esta coisa das trilogias: é preciso ter muito boa memória. Ainda mais porque o segundo filme acabou em suspenso, e até que uma pessoa se lembrasse de quem andava enrolado com quem e quem é que andava a trair quem demorou um bocadinho. Grande momento inicial com a música. Talvez o ho ho ho and a bottle of rum tivesse um efeito mais poderoso, mas mesmo assim, estupendo. Como se trata de um filme americano de grande orçamento, será preciso falar da extrema qualidade de filmagem e fotografia? Não me parece. Belíssimas imagens, como quando Jack Sparrow está no Cofre de Davy Jones a liderar-se a si próprio, ou quando o Pérola Negra cruza um mar cheio de estrelas, a confundir-se com o céu, ou mesmo o gelo, e o remoinho, e… ah, belas imagens mesmo.

Depois, a entrada do nariz de Sparrow em cena. Depp é um dos melhores actores da actualidade, quem o nega vai arder no inferno. E com esta personagem… orgásmico. Estamos sempre à espera de ver mais um bocadinho dele, mais um tique, mais um ‘savy?’. O Orlando Bloom não lhe chega aos calcanhares, e felizmente neste filme deixaram-no em pequeno item no ambiente de trabalho. A menina Keira, que partilha dos mesmos ideais de beleza que eu (bela Bellucci…) ainda tem muito a aprender. Não gostei lá muito dela neste filme. Podia ter feito muito melhor, ainda por cima agora que a deixaram brincar com espadas e tudo. Espantosa esteve a Calipso (Naomi Harris) – aproveitem a rapariga para mais filmes – e também o senhor que fazia de Davy Jones (Bill Nighty) – um par romântico bem improvável (bela moral esta, o amor puxa-nos para o abismo e coisa e tal). E Geoffrey Rush, que representa maravilhosamente papéis em que está doido ou sujo ou ambos. Pena não ter havido mais exploração desta personagem, acho que não se perderia nada.

E os dois minutos de Keith Richards. Memorável, ver a inspiração e o produto no mesmo plano. How’s Mum? ;)

Tanta, tanta personagem. Aqueles lordes dos piratas inesquecíveis. Como é que podem dizer que na altura do Errol Flynn é que era? Coreografia das lutas de espadas? Corporalidade? Mas vocês, críticos, já viram mesmo um filme do Errol Flynn ou só estão a falar do que leram nos livros franceses sobre cinema? Porque eu gosto bastante de ver filmes do Flynn (ele é um dos meus guilty pleasures), e são muito engraçados, principalmente porque ele tem aquele riso específico 'ah ah ah', e põe a mão na anca, e finge que beija a Olivia de Havilland uma data de vezes, e pronto. Agora o Johnny Depp, não me façam falar do Johnny Depp...

Que dizer mais? O filme safou-se bem, ousou para além da americanice do filme previsível, e, mais importante que tudo (spoilers alert) matou o Orlando Bloom (end spoilers alert). E isso, meus amigos, nunca é pouco.

segunda-feira, maio 07, 2007

O Mistério da Estrada de Sintra (2007), Jorge Paixão da Costa


O melhor elogio que se pode fazer a este filme é comentar, ‘bolas, não parece nada português’. Meus caros amigos, passei horas e horas a comentar a fraca qualidade da fotografia cinematográfica em Portugal, para chegar este filme e desmentir-me à parvalhota. Lindo lindo lindo.


Depois o som. Vocês sabem como o som nos filmes portugueses costuma ser uma treta, tendo-se de recorrer constantemente às legendas para perceber a diarreia verbal que os actores vão tendo. Sempre me intriguei porque raio percebíamos tão bem as novelas e a treta de um filmezeco era tão complicado. Este filme utiliza o som dobrado, e por vezes nota-se, mas – meus caros amigos – a nitidez da compreensão sonora chega a um tal refinamento que julgamos estar perante um filme feito no estrangeiro.


Digamos de passagem que a história é bastante boa. Sempre achei que aquele grupinho de dandies que adorava andar à porrada com os românticos dava umas boas horas de entretenimento celulóidico. Pegar na génese da obra ‘O Mistério da Estrada de Sintra’ não é propriamente original se pensarmos a nível mundial (Shakespeare in Love, Amadeus, Relatório Kinsey... ) Mas dentro da ‘indústria’ portuguesa, penso que é insólito. E é bom reparar que temos tão bons temas inexplorados dentro das nossas parcas fronteiras.


Durante esta semana andei a berrar para quem me quisesse ouvir que os dois grandes problemas do cinema português são dois pontos a ausência de grandes planos e planos de pormenor (uma espécie de pudor em aproximar demasiado a câmara das coisas) e a falta de credibilidade dos actores a desempenharem os seus papéis.


Adoro ser contrariada nestas coisas. Este filme utiliza todos os planos e ângulos correntes do cinema comercial – já vou discutir isto do comercial mais à frente – e os actores, com excepção de uns secundários ocasionais, são tão bons nos seus papéis que agora quando imaginar o Eça de Queirós vou sempre ver o Ivo Canelas. E o António Pedro Cerdeira, que admiro há um certo tempo, está tão bom como o protagonista, mas fica educadamente em segundo plano. E a condessa, interpretada por Bruna di Tullio, argh, que linda e perfeita para o papel. Noto em Canelas sobretudo aquilo que ele uma vez disse num workshop sobre A Tempestade de Shakespeare, onde tive o prazer de participar – repetir as falas em todos os momentos até elas fazerem parte de nós e saírem naturalmente como se fossem nossas. Isto só para dizer que já estive na mesma sala que o Ivo Canelas. Nã nã nã nã nã, nã!


Li no Público, aquele reduto da crítica implacável (tenho a impressão que foi o Vasco Câmara que escreveu, mas não ponho as mãos no fogo), que isto era um novo Crime do Padre Amaro, feito para atrair as audiências, baseado em Eça de Queiroz que nos últimos tempos se tornou uma espécie de Jane Austen portuguesa (esta piada é minha, que os tipos não têm nível para dizer este tipo de coisas), e blá blá blá que treta de filme, buga dar só uma estrela e espetar 5 estrelas naquela cena do Tati, porque sobre ele já há livros e estudos editados há muito tempo.


Por vezes dou por mim a pensar que sou uma espécie de D. Quixote da crítica, a defender filmes que todos mandam abaixo, a mandar abaixo filmes que toda a gente exalta, e que qualquer dia estou eu a ir em direcção a um jantar romântico nas cantinas e sou brutalmente atirada das Monumentais abaixo. Hum, não é uma imagem bonita. Mas deixem-me mandar os meus lamirés irreflectidos enquanto o meu nome não andar pelas revistas cor-de-rosa: desde quando é que um filme tentar atrair público é pecado capital? E comparar com o Crime do Padre Amaro? Por Favor! Sim, está lá o Eça, está lá o sexo, estão lá os seios perfeitos das duas tipas, mas não estão lá os homossexuais, nem os gangs, nem a banda sonora dos Da Weasel ou outro grupo semelhante… nem a presença da nudez da actriz para compensar a falta de jeito da mesma para representar! Em verdade vos digo, saí muito feliz do cinema por pensar que há pessoas competentes no cinema em Portugal, e que talvez haja salvação para quando começar a trabalhar cá. E um filme com tantas referências históricas e literárias, será que podemos mesmo etiquetá-lo de comercial? Para mim, que não sou ninguém, não me canso de vos lembrar, é um delicioso exemplo de ‘meio-termo’ entre o telefilme para os putos de 12, 13 anos baterem umas pívias e o filme de inspiração oliveiresca com 5 planos e 4 horas para os intelectualóides se dedicarem a fantasias onanistas.


Vão ver. Ajudem a tornar este o filme português mais visto de sempre. Para limparmos as estatísticas e fazerem uma edição especial em DVD, e não desaparecer como é costume com os filmes bons feitos por cá…

terça-feira, abril 10, 2007

300 (2007), Zack Snyder


Depois de ter pregado sem fim contra filmes ‘de coçar os tomates’, advogando um maior respeito para o chick flick como género de qualidade, acusando os filmes da história do cinema serem quase sempre de homens para homens, eis que vou ver o 300, assim, por impulso. Céus, sou uma criatura tããão contraditória.

Mes amis, eu também já tinha ido ver o Sin City e adorei (por acaso ou não, a parte que mais adorei foram os escassos minutos filmados pelo Tarantino, embora na altura não o soubesse…). Ah e coiso e tal, mas isso era pelo interesse estético e cinéfilo, era um filme marcante na adaptação de banda desenhada ao cinema. Ok, talvez.

A verdade é que estou a pensar fazer um trabalho sobre o peplum para uma cadeira, como ele influenciou o studio system e outras coisas históricas e teóricas que não vos interessam minimamente. E, quer dizer, eu adoro a civilização grega. E como ultimamente os filmes passados nessa época têm sido… hum… um bocado ao lado (Alexandre o Grande, Oliver Stone; Tróia, nem me lembro de quem foi o criminoso que realizou) pensei: as histórias do Sin City eram mais que porreiras, revelavam um cérebro por detrás daquilo. Aquele Frank Miller é capaz de ser bom. Buga lá ver o que ele fez à história do Leónidas.


É muito bom.


E estava a pensar acabar a conversa por aqui. Mas o meu ethos não o permite. Deixem-me justificar, então.

O ambiente do filme é totalmente artificial. Tudo cheinho de filtros e efeitos digitais, até as espigas de trigo a abanar ao vento. Os actores masculinos têm tantos músculos que também somos inclinados a pensar que são produzidos digitalmente, mas lamento meus amigos masculinos, vi umas fotos do making of e aqueles músculos são reais.

Tudo é estilizado, num agradável encontro entre banda desenhada (e o cinema tem tanto a aprender com esta arte – até eu estou a pensar começar a interessar-me pela coisa) e uma graciosidade oriental (o que não deixa de ser irónico, num filme em que vemos os ocidentais a dar cabo do coiro aos asiáticos) roubada quiçá a Kurosawa, e utilizada com toda a mestria da slow motion. (enfia esta, Bazin!)

Engane-se quem julga que é só mais uma adaptação de bd ao grande ecrã. 300 grita cinema por todos os pixels. Au au au (para quem não viu o filme, e não se importa de ler um spoiler de vez em quando, este é o grito de guerra espartano.)

E não esqueçamos que não há uma única star neste filme. Sim, nada de Russell Crowes, nem de Angelina Jolies, ou mesmo (argh) Brad Pitts e Orlando Blooms. Meus caros amigos, nada de caras conhecidas. Isso porque o protagonista Leónidas é interpretado pelo escocês Gerald Butler, que ‘vimos’ em… O Fantasma da Ópera (2004, Joel Schumacher)!!! E ele é simplesmente o Leónidas perfeito. A forma arrogante como fala com a boca cheia de maçã enquanto os seus soldados empilham os cadáveres persas… lindíssimo. E Xerxes é interpretado por um brasileiro, Rodrigo Santoro, e não sei se é por isso mas faz lembrar o Ney Matogrosso…

(já repararam que, em Hollywood, os brasileiros são sempre abichanados e os portugueses sempre contrabandistas mexicanos? Quem quer investigar isso em pormenor?)

Nem sei que diga mais. É tão raro eu não ter um segundo de tédio nos filmes que o facto de não me ter aborrecido no intervalo sequer é um óptimo sinal. Ah, antes que me esqueça. Houve para aí uma polémica qualquer sobre Leónidas ser uma metáfora para Bush, a derrotar os orientais um a um etc. Ãh? Foram ver o filme certo, de certeza? Foram ver o filme? A última pessoa em que penso quando olho para Leónidas é em Bush. Aliás, ele é muito mais parecido com Xerxes, o auto-intitulado Senhor do Mundo. Não estou a ver o Leónidas a engasgar-se com um biscoito. Além que ele era Espartano, logo, Europeu. Nós europeus somos frescos, quando provocados.

Vão ver o filme. Quatro euros dos mais bem gastos deste ano, de certeza. Au au au.

Mr. Bean em Férias (2007), Steve Bendelack


Sim, fui ver este filme em vez de ir ver O Labirinto do Fauno… Que querem, há dias em que pura e simplesmente não me apetece ver filmes bons e que ficarão na história do cinema, há dias que são dias de filme-pipoca. Este foi um deles.

É um bom filme-pipoca, sim senhora. Infelizmente, só funciona naquelas pessoas habituadas 1. a toda a mitologia mr. beaniana; 2. ao humor britânico, tão diferente do que estamos habituados na nossa pobre província de Espanha … (entre os espanhóis e Salazar, venham os espanhóis!)

Ora é um filme que prima por não obedecer ao politicamente correcto – goza com a cultura francesa, goza com a indústria do cinema… aliás, interessante pensar que a única cultura que aparece e que é respeitada sem excepção é a russa. Hum… spaseeba.

Rowan Atkinson mais uma vez na personagem que lhe granjeou fama internacional (senti falta do Teddy, onde é que ele andava?), acompanhado de um rapazinho que talvez tenha um futuro glorioso à sua frente (já não ponho as mãos no fogo por ninguém, olhem o Paul Betany a participar no Código da Vinci…) A rapariguinha que quer ser uma actriz reconhecida é engraçada, mas ainda não foi desta que o Mr. Bean arranjou uma namorada… Brutal esteve Wilhem Dafoe, no papel do realizador narcisista ao extremo. Aquele filme idiota, Playback Time, faz lembrar umas coisinhas que se fazem aqui no velho continente (mas ei, nem tudo o que passa em Cannes é assim tão sonífero… espero eu).

Momento de reflexão intelectual – lá esteve o debate película vs. digital. A primeira ainda associada ao prestígio de ser um realizador ‘a sério’, o segundo associado ao experimental, ao amador, etc… Mas tudo é cinema, certo? E, como defensora do digital como evolução lógica do cinema (baixa custos e facilita a montagem), deixo a pequena notinha de rodapé que o Senhor David Lynch – que é o Deus de muitos cinéfilos – rodou o Inland Empire totalmente usando a sua câmara caseira – e adorou. Ah, toma esta, Godard…

Voltando ao filme de entretenimento que é, afinal, o tema deste post, grandes momentos: Mr. Bean a comer marisco, Mr. Bean a dizer Non, Oui e Gracias, Mr. Bean a cantar ópera, Mr. Bean vestido de mulher a tentar entrar no Festival de Cannes, a deliciosa junção do áudio de Playback Time com o vídeo de férias de Mr. Bean.

Menos bom? Sei lá. Estava ocupada a divertir-me…

NOTA: Lusomundo, o que fizeste às cópias do The Fountain, já tido como um dos melhores filmes do ano? E que tal tirar o The Departed das salas de Coimbra e pôr lá esse filme que andamos todos (nós, que nos dizemos cinéfilos e depois compramos cds de música) ansiosos pra ver?

quinta-feira, abril 05, 2007

Música e Letra (2007), Mark Lawrence


Yeehhh, buga lavar o cérebro.... hum? Nem por isso...

Mark Lawrence, como vejo nas minhas cábulas electrónicas, fez as duas Miss Detective e ainda as Forças da Natureza. Tudo caminharia para um óptimo filme romântico, certo?
Ok, não sejamos tão más. O Hugh Grant a fazer de ex-estrela rock tem a sua piada. Os seus movimentos pélvicos também. Mas... hum... parece tãããão visto. E sabem que eu aprecio chick flicks, reconheço-lhes valor, etc. Mas tinha tanto para ser original, e falhou... Drew Barrymore. Um bocado apagadita, não? A personagem podia ser tão mais explorada, tão mais interessante... Um hurra para a rapariga que fez de caricatura da Britney Spears, a Haley Bennett. Vamos estar de olho nela.

Apetece-me chamar a atenção (a sério, eu hei-de escrever um dia a sério sobre isto) para a subversão de papéis dos sexos neste filme. Se bem que a irmã de Sophie personifique na perfeição a mulher que passa as noites a seguir as soap operas na tv, Sophe é a intelectual da história e Alex Fletcher o objecto sexual. Isto torna-se especialmente óbvio quando, após a cena de sexo debaixo do piano (em vez de em cima - algo diferente, obrigado) vemos Grant em pêlo e Barrymore pudicamente embrulhada na manta. Ok, depois temos Cora com os seus movimentos a apelar a luxúria, mas mesmo assim... algo se começa a adivinhar em Hollywood, digo eu...

O argumento está óptimo, grandes tiradas cómicas, etc. A subplot da relação esquisita entre Sophie e aquele escritor convencido foi uma boa aposta (ambos os elementos do par romântico têm problemas com o passado). A crítica à sociedade de entretenimento tipo fast-food (os best-selllers logo adaptados a filme, os programas de luta livre entre ex-estrelas, a pop star budista que julga que o Dalai Lama é, efectivamente, uma lama...) é o ponto forte da coisa, por assim dizer.

Palmas para os créditos iniciais (com o Hugh Grant com o penteado mais cómico do ano) e para os finais, se bem que a piada da operação às ancas resultou bem da primeira vez, mas à vigésima terceira já enjoava...

A música não é má, i.e., falo daquela que guia o fio condutor da história. Mas também há umas músicas conhecidas postas muito baixinho em background (começamos a pensar que a porcaria da sala não está bem isolada e estamos a ouvir o filme da sala ao lado...) que desconfio foram postas à traição para aumentar o número de faixas da banda sonora. Isso não se faz.

A elogiar também, e é tão raro haver elogios deste género neste género de filmes (estou a repetir género de propósito, só pra saberem) a fotografia. Sim, leram bem.

segunda-feira, abril 02, 2007

Pecados Íntimos (2006), Todd Field




Finalmente fui ver esta coisa.

Era melhor do que eu pensava. O tom irónico de toda a história, em que ninguém se consegue enquadrar nas categorias normais bom/mau, a forma ousada de filmar (a ilustração de pormenores enumerados pelo narrador, por exemplo da descrição e comparação da mulher de Brad, Kathy, e a marginal Sarah interpretada por Kate Winslet; o plano-sequência temporal feito à borda da piscina) e um final que é pura e simplesmente brutal na sua fidelidade ao que costuma acontecer fora dos filmes.

Todas as personagens são brilhantes, não só nas suas características (à partida definidas por Tom Perrota, autor do livro) mas nas brilhantes interpretações que os actores fazem delas. Um ave muito especial para a senhora que interpreta a mãe do pedófilo, Phyllis Somerville, e para Kate Winslet (será porque a personagem dela é minha homónima? É uma possibilidade, mas a verdade é que a adoro). As cenas de sexo são tórridas e, ao mesmo tempo, com algo parecido com humor ou sarcasmo (a loucura em cima da máquina de lavar ou os vários planos evocados pela mente de Sarah enquanto discutem Madame Bovary no clube de leitura… )

E seria tão fácil convencer-nos que o pedófilo era um homem/criança arrependido… E quando o vemos sair com aquela estranha rapariga depressiva, julgamos que tudo irá acabar bem entre eles… Sol de pouca dura. Mas para quê um tarado apenas por filme quando se pode ter vários? O amigo de Brad, que preenche o tempo livre a torturar a paciência do pedófilo, em defesa dos bons costumes (ele que tem o passado manchado), é um maníaco que nos faz ter pena do coitado do molestador de criancinhas… No fim desejamos que lhe seja espetada uma faca no bucho. Ops, mais uma vez vemos as expectativas goradas.

É tão bom assistirmos a um fim tão imprevisível, em termos cinematográficos. Tudo caminha para outro lado. Mas as tragic flaws de cada uma das personagens estão presentes até ao fim, não há maneira de as coisas acontecerem em função de um happy ending forçado. Brad pura e simplesmente não quer crescer, não quer entrar na Ordem, não quer assumir a sua vontade de separação da mulher (afinal, eles são o casal perfeito, e Sarah é tão feia…). Sarah resolve vingar-se do hobby onanista do marido entrando numa aventura que segundo ela lhe mostra o que é estar viva, e no fim mostra-se demasiado frágil para lidar com a recusa. O pedófilo é afinal um Édipo; o maluquinho defensor dos bons costumes afinal até tem bom coração.

A subtileza do filme funciona tão deliciosamente bem, é tão refrescante… Sabe bem ver um filme destes de vez em quando. Há que admitir que lembra um bocado Beleza Americana de Allan Ball, mas menos macabro, definitivamente. Todd Field tem muito jeito para a coisa, sim senhor. Está contratado.


segunda-feira, março 19, 2007

Cartas de Iwo Jima (2006), Clint Eastwood





No fundo, no fundo, o que eu queria ir ver mesmo eram os Pecados Íntimos. Mas como falaram tão bem deste filme, ah, e tal, fantástico, e como eu gostei do Mystic River e filiei-me à pouco tempo numa sociedade maçónica de lobby anti-Scorsese porque realizadores populares não prestam para a comunidade underground, lá fui. Era suposto ter ido ver Flags of Our Fathers primeiro? Mas eu tou tão farta de filmes que pregam que a América é a maior, etc…

Primeiro ponto positivo: um filme sobre japoneses falado em japonês. Isto é bom. Se não fossem os artifícios técnicos americanos e a ausência de qualquer cena de kung-fu, ou seja, fechando os olhos, até parecia um filme nipónico.

Segundo ponto positivo: o homem filma bem, mas tão bem ao ponto de meter nojo a nós, míseros mortais que nos temos de contentar com mini-dvs e digitais 8. Mas quer dizer, é o Clint Eastwood, é o mínimo que se lhe podia pedir.

Menos bom (ou seja, a razão porque 4 euros gastos nos Pecados Íntimos talvez tivessem sido um melhor investimento) – mas que raio de primeira parte longa e aborrecida é aquela? Bolas, é um filme americano! Eles sabem como nos grudar a um filme, a sofrermos com as personagens, etc etc… Que é disso? Os tipos estavam metidos numa ilha, à espera de um ataque a qualquer momento, começaram a ver que estavam fritos… onde está a angústia/raiva/desânimo?

E aqueles flashbacks… os que mostravam o comandante Kirabaschi a privar com os americanos estavam muito bons, o do momento do cão... brutal. Mas aquela treta de quando foram buscar o padeiro… não havia mesmo outra maneira de nos dizerem que ele tinha mulher e filha?

É que um filme ou quer o espectador grudado ou quer o espectador como frio observador. Se escolhem a segunda opção, aquele momento final em que se descobrem as cartas vai soar a fatela. Ah, as cartas de Iwo Jima, ai que lindo, ainda ali estão, o outro tipo enterrou-as…

Pessoalmente, acho que o filme não perderia nada em ser um bocado mais a puxar para a lamechice e emoção. A começar de uma maneira que me lembrou logo o Titanic, nem iria parecer desbocado. Ou o Eastwood é demasiado macho para esse tipo de coisas? Não me parece…

É que se não fosse a primeira parte que se arrasta de maneira interminável… (apresentar as personagens durante uma hora e meia, quase? Ãh?), o filme era tão bom. Com japoneses a explodirem com granadas agarradas contra o coração… E o tipo que queria arrebentar com os tanques…

Quer dizer, não me apetece ver o filme outra vez. Ná. Estava à espera de ser arrebatada e népias. Há bons momentos, mas nunca se chega a um orgasmo cinematográfico.

Pronto, e estou chateada, porque começo a pensar que se calhar o The Departed era mesmo o melhor filme e isso é um pensamento que me perturba profundamente. Argh.

Se calhar estou é farta de filmes de coçar os tomates e beber minis… (que foi um termo que inventei mesmo agora para contrapor aos tãos criticados chick flicks… )


Venham os Pecados Íntimos. Subúrbios americanos sempre deram bons filmes. Acho eu.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Scoop (2006), Woody Allen




Pode-se dizer que estamos a assistir a uma moda de filmes sobre mágicos (O Ilusionista; O Terceiro Passo; e, um pouco no gozo, mas no fundo a sério, acrescento todos os Harry Potter) e com baralhos de cartas, mas um Woody Allen é um Woody Allen, e, como tal, eu, que não tenho perdão por ter perdido o Match Point, decidi, não!, nem pensar em perder este. E lá fui, toca toca, em direcção àquela cadeia de cinemas que eu tanto odeio mas à qual tenho de ceder para ver o que a indústria cinematográfica vai vomitando, enquanto a náusea está fresca. Isto de ler Sartre e biografias do Shakespeare ao mesmo tempo deixa-me um pouco mórbida, desculpem.



A história é bestial, como sempre. Simples, com desfecho não óbvio (ou será que estamos tão ocupados a rir que nem nos damos conta que caminhamos para o fim?), Hugh Jackman no papel de Peter Lyman, um jovem milionário bastante charmoso e possível serial killer do tarot, Scarlett Johannson a mostrar que afinal até é boa actriz, só que de vez em quando esquece-se (o Woody também lhe deve dar nas orelhas com força), Woody Allen a fazer de ilusionista (bastou aparecer e o público começou a rir – tenho de considerar a hipótese de existir um público culto em Coimbra, mas a ideia por si é assustadora), e tudo o que há num filme de Woody Allen: o neurótico (agora a dobrar, Scarlett e Woody dupla de força dos óculos de massa), as piadas sobre judeus, o momento estranho (a barcaça da Morte só podia vir da mente retorcida do meu cwarinetista realizador de eleição), os diálogos são TÃO BONS, com aquelas frases que nos lembraremos daqui a anos (gostei especialmente daquela ‘eu nasci na religião hebraica, mas cedo me converti ao narcisismo’) que, de facto, ao assistirmos a um humor inteligente que não recorre ao calão, à escatologia ou à crítica política para nos fazer rir, até nos esquecemos de fazer uma avaliação da coisa em si. Além de que é Woody Allen, e, não fosse o facto de tanto ele como eu sermos ateus, eu diria que era Deus. Por isso vou-me limitar a uma análise assim um bocado no ar, sem qualquer sequência lógica ou pretensão de ethos, como aliás é meu costume.



A notar que é o primeiro filme de Allen (que me lembre, também não nasci assim há tanto tempo…) que não usa o jazz mas sim a música clássica. Grieg, para ser exacta. In the Hall of the Mountain King, se não me engano. Para os leigos que não têm a felicidade de ter quatro anos de Conservatório e uma colecção de cds upa upa como eu, é a música do Grinch. Ahhhh. Bastante adequada, aliás. E mais umas coisas que eu, embrenhada no Jackman, nem me lembrei de pensar o que era. E não deixa de ser Allen por isso. Fantástico. O homem é um génio.



Grandes momentos: a barcaça da Morte (sempre que aparece é o êxtase), o aparecimento do espírito do jornalista frente aos olhos de Scarlett e Woody, a festa em casa dos Lyman com todas as inconveniências do ‘pai’ de ‘Jade’, Woody Allen a tentar conduzir pela esquerda (ele dá todo um charme àquela coisa estranha que é o Smart), o momento em que a verdade é toda revelada.



A fotografia aposta nos tons quentes, uma Londres tão solarenga que começamos a duvidar que o filme tenha mesmo sido filmado lá. Ah, the british accent…



A ver, absolutamente, porque eu digo que sim e eu é que sei. Do alto do meu poder como membro mais recente da Igreja do Narcisismo. São Narciso vos abençoe ya men.