quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Cassandra's Dream (2007), Woody Allen

O fim da trilogia londrina. Uma cidade chuvosa que acolheu Woody Allen como seu filho, e, a julgar por Match Point (um dos momentos altos da carreira, digam lá o que disserem), o regresso a uma fase inspiradíssima, com uma nova musa: Scarlett Johannson.

Ora, ao contrário de muitos, eu sei que o senhor Woody é só humano, e como tal não espero que ele me surpreenda todos os anos com masterpieces porque, caso não se lembrem, nem o Ingrid (Bergman) fazia isso. Nem ninguém.

Defendo o direito dos pobres realizadores a sentirem-se menos inspirados. E sim, Cassandra’s Dream é um filme menos inspirado, mas não deixa de ser: 1. do Woody Allen, o que é muito melhor que ser um mau filme, digamos, do Spielberg; 2. comestível. Porque isto de considerar que é um filme abominável só porque antes há a luz brilhante de Match Point… percebe-se que as expectativas talvez estivessem altas demais, mas prejudicar o filme per se por isso… não me parece justo.

Falemos do filme, então. Dois irmãos – interpretados por Colin Farrell e Ewan McGregor – querem ser ricos. A oportunidade para isso surge de uma forma… hum… pouco moral. E eles buga (intervêm aqui também coisas como o valor do sangue, tudo pela família, nada contra a família, etc). Depois – um deles arrepende-se. E tcharam.

No fundo, no fundo, este é o outro lado de Match Point (será por isso que tanta gente ficou desiludida?). Ou seja, o crime e a ambição, neste filme, não compensam. Ohhhh. Moralidade barata, portanto. Tenho de confessar que é tudo muito tragédia grega, muito castigo dos deuses etc, e que por isso tem um travozito a banalidade.

Música? Philip Glass!!!!! Sim, sim, sim. Tercinas para cima e para baixo, a inexorável força do destino, yeah. (devo dizer que não sabia disto antes de ver o nome nos típicos créditos iniciais, e dei gritinhos de alegria que puseram todo o público a olhar para mim desconfiado).

Colin Farrell surpreendentemente óptimo actor, dos olhos inquietos às unhas sujas (interpreta a personagem de um mecânico), e é para mim (que, como digo sempre, não sou ninguém nestas coisas) a mais valia do filme. Já Ewan McGregor podia estar tão melhor que não sei se lhe perdoo. (é uma personagem que não perdia nada por mostrar mais complexidade, e isso antes da cena final no ‘Cassandra’s Dream’, o barquito dos irmãos).

Mais… a técnica não está nada de especial. Quer dizer, não há aqueles deliciosos planos-sequência à la Allen, o que me fez suspirar. Ai… Só campo e contra-campo, e não, isso não é o estilo Woody habitual. Vejam bem os filmes anteriores dele. Bem, bem. Vêem os belíssimos planos-sequência? Cadê deles neste filme? Pois.

Será que a ausência de Johansson justifica esta desinspiração? Sou levada a crer que sim. De qualquer modo, Woody já trocou a cidade do smog pela do Gaudí, e só espero é que se lembre de dar uns saltinhos grandes aqui ao país vizinho. Filmar, quiçá. Se bem que com a sorte que eu tenho, vou estar do outro lado da Mancha quando isso acontecer. Argh.

Não acho que isto seja o início do fim. Repito: todos temos o direito a ter dias menos inspirados, incluindo essa sumidade que é o Sr. Allen. Ele anda a repetir temas? Ouvi dizer que isso se chama marcas de autor. Por muito estúpido que seja, se calhar é isso mesmo. Nem sempre nos caem bem, pelos vistos. E falando nisso, onde estão os one-liners citáveis?

Bom momento: após um acontecimento trágico, as duas cunhadas fazem compras descontraidamente, falando de futilidades – um dos raros momentos allenescos, realmente, de ironia trágica.


Volta Woody Allen, estás perdoado.

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