sexta-feira, novembro 24, 2006

Maria Antonieta (2006), Sofia Coppola


E as primeiras palavras que se impõe nesta crítica são : FINALMENTE!!!!

Após um longo ano de espera, mes amis, Marie Antoinnette da senhora Coppola dignou-se aparecer em Coimbra, já um mês depois da estreia oficial neste 'pedaço de merda à beira-mar plantado', como já ouvi dizer nem sei por quem. Mas não interessa. Mais vale tarde do que nunca.
Primeiro ponto: um filme deitado abaixo pela crítica portuguesa é sempre um filme a ver. Depois, a oportunidade de me espetar no cinema sozinha (mesmo sozinha, ninguém na sala) é a não desperdiçar (nota para o futuro: fazer isto mais vezes). Por fim, o filme é bom, inovador, e resulta muito bem se entrarmos no espírito da coisa - adolescente lançada aos monstros, incompreendida, etc etc.
Bem, a música e a maneira de filmar chocam mesmo com a ideia de filme de época, biopic, whatever. Talvez por isso tenha sido tão mal recebido. Uma coisa é o Coração de Caveleiro, que não pretendia representar nenhuma realidade histórica - está cheio de anacronismos, tipo a armadura da Nike - e é um teen pic, o que afasta os senhores críticos barbudos todos. Agora, a filha do Coppola a fazer isso com a vida de alguém que existiu - ui, cruz credo, acudam. Sim, foi apupado em Cannes, e como lá também se riram no Código Da Vinci, talvez isso quisesse dizer alguma coisa, mas sabem como é a droga nesses festivais - bate forte e o cor-de-rosa dá tripes maradas.
Todo o ambiente é de auteur, a história está bem contada (adorei o facto de ter terminado quando e como terminou), Kirsten Dunst muito protagonista, olhos todos pra ela, nem sequer me lembro da interpretação dos outros - é pra verem como ela esteve bem. Todo aquele cor-de-rosa, fantástico, muito kitsch, os bolos que fizeram a minha barriga rosnar, os fogos-de-artifício, a ópera,... muito Coppola, muito soft, muito queridinho, muito bom.
A realçar o uso do som e do silêncio, tudo muito bem pensado, aquele tique-taque infernal no quarto da Maria Antonieta, os 'paxarinhos' - aprendam, cineastas portugueses!
Grandes momentos: todas as cenas nocturnas entre Maria Antonieta e o Rei Luís (que devia julgar que as crianças vinham das couves ou qualquer coisa assim), o jogo 'guess who I am', a traição com aquele conde 'gostoso' -ui ui a minha fidelidade -, os pequeno-almoços, a festa de anos da rainhazita, etc etc etc. Bolas, vejam por vocês. E não, não recebo parte dos lucros do filme. Apenas me chateia que andem tão mauzitos com os filmes que saem das histórias de gangsters e atentados terroristas. Isso sim é um lobby americano.
Não me apetece dizer mais nada, vou ter aula. Talvez republique o post depois de uma reflexão profunda, ou não. Definitivamente não.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Perfume (2006), Tom Tykwer


Sim, a Maria Antonieta já chegou a Coimbra (demorou-se porque se esteve a vestir), mas eu tinha, absolutamente, de ir ver este filme. É com alegria que anuncio que SIM, li o romance de Patrick Süskind antes de ver o filme e – é tão raro isto acontecer – NÃO, não fiquei NADA desiludida com o filme. Agora que aprendi o valor expressivo de usar maiúsculas num post, não quero outra coisa. Agora que descobri que é possível uma adaptação que capture a essência – percebem, essência, perfume… hoje sinto-me genial – de um livro, não vou perdoar ou ser complacente (vêem? Até uso palavras caras…) com os próximos Harry Potter, nem com nada do género que nos reserva o futuro.

O filme é MUITO BOM, mesmo. Conseguiu libertar-se do estigma da adaptação - e agora vou citar João Mário Grilo, só pra dar uma de snob que por acaso anda a ler sobre estas cenas: Regra geral, basta que um filme enuncie claramente que é “adaptado de…” para que sobre ele pensa, imediatamente, uma hipoteca identitária, com o seu rosário de especificações e – pior ainda – comparações. («O cinema não filma livros…», in Discursos. Estudos de Língua e Cultura Portuguesa, nº11-12 (Outubro de 1995/Fevereiro de 1996), p.210). Tenho de confessar que sou uma daquelas pessoas que gosta de ver adaptações fiéis que excedam o original, se possível. Este filme é um desses casos.

Pronto, tenho de falar do filme propriamente dito. O realizador, Tom Tykwer, é o mesmo de Lola Corre Lola - ou seja, o tipo tem efectivamente um fetiche por ruivas. Os actores principais são ilustres desconhecidos. O rapaz que faz de Jean-Baptiste Grenuille (Ben Whishaw), se bem que mais bonito do que a imagem transmitida por Süskind, faz um papelão daqueles de fazer muita impressão. Ele veio para ficar, mes amis, ouçam o que eu vos digo. Pelos vistos fez de criado da Pórcia no Mercador de Veneza - bem me parecia que a cara não era estranha.
Algures li uma crítica (naquele jornal que começa por P, acaba em O, e é sinónimo literal de audiência) – negativa, porque crítico de jornal é um monstro sempre muito mal disposto para tudo o que perturba a sua normalidade de matiné da Sic de tarde – a evocar Hannibal Lecter. Sobre o Silêncio dos Inocentes, devo ser das únicas pessoas que leu o livro e não viu o filme. Mas percebo a ideia. Sim, um serial-killer sem sentimentos que procura o perfume ideal, estou a ver as semelhanças. Mas negar que a história de Süskind é muito boa – mais não seja pelo incrível twist final e pelas descrições abrasadoras de algo tão indescritível como o é um cheiro – só porque é um best-seller de há 20 anos e muita gente a leu – francamente! É o mesmo que negar originalidade à J. K. Rowling só porque combina Tolkien com Enid Blyton – que mal tem uma pequena mistura de vez em quando, seus puristas manhosos? (Eu hoje tou pra defender o Harry Potter – a obra literária, bem entendido. Sim, literária) Há imensas histórias de serial-killers, ora essa, e esta é radicalmente diferente do comum – quanto mais não seja pela temática do ofício de perfumista. Senhor Jorge Mourinha, go f*ck yourself, seu escritor falhado. Sim, falar sobre o filme. Não me esqueci.

Retomando os actores, o tipo que faz de Grenouille está nos trinques. As ruivas, pronto, além de serem ruivas passaram um bocado ao lado. A virgem final – a 13ª essência – devia ter algo mais nela para suscitar a obsessão de Grenouille além daquele cabelo fenomenal. Um Dustin Hoffman irreconhecível até ao momento em que abre a boca – ainda estou para decidir se isto é uma crítica ou um elogio, desculpem. Alan Rickman, ou ‘Snape’ – deve ser por isso que o Harry Potter não me sai da cabeça – mediano, mediano.

O argumento adaptado, como acho que já perceberam, está genial. Claro que a Caroline Thompson tinha de estar metida nisto. Uma tipa que se mete com compositores tem necessariamente de ser genial (pronto, a primeira private joke deste blog. Já tardava…). Para quem a não conhece, sim, é uma habitual colaboradora de Burton. Não se percebe? :) (eis o primeiro smiley do blog)

A fotografia está de bradar aos céus a perguntar: “Deus, porque não contrataste este director de fotografia para te ajudar durante a Criação? Sua divindade inconsequente e inexistente…”. Todas as cores de Grasse estão – ui – aromáticas como tudo. Uma das virtudes deste filme – ou terá sido dos comprimidos da gripe? Ou de ter estado três dias sem sentir o cheiro das coisas e estar cheia de saudades? Sei lá – é evocar os cheiros tão bem ou melhor do que o livro. Para mim o cheiro sempre foi um elemento potencialmente cinematográfico. Nos inícios do cinema ainda tentaram, mas sabem como é, era algo tão ridículo, raspar uma lista em determinado sítio correspondente a determinada altura do filme… Tenho perfumes que associo a filmes, o da pessoa mais perto de mim que se encharcou antes de vir para a sala. (por isso é que para mim ir ao cinema é que é. Em casa o único cheiro que tenho é a comida ou a cão.) Toda aquela fruta tão viva, aquelas flores coloridas, a própria banha… hum! Uma verdadeira Gesamtkunstwerke…

Momentos memoráveis – o nascimento de Grenouille, os da vendedora de ameixas, enquanto viva e enquanto cadáver, a casa do perfumista a desabar, todo o empenhamento de Grenouille na sua colecção, e, last but not least, o momento em que Grenouille sobe ao cadafalso – e para não ser acusada de spoiler, não vou adiantar mais. Claro que o final touch tem muito que se lhe diga…

Quatro euros muito bem pedidos emprestados para ver este filme. Sem dúvida. Subiu a fasquia para os próximos que for ver, disso tenho a certeza. Mais um que vai para a colecção de DVDs mal fique a um preço decente – isso diz quase tudo, não? Snif snif.

PP- Nunca entrei dentro de tantos narizes como neste filme, disso tenho a certeza… Otorrinos, este é o vosso filme por excelência.

quarta-feira, novembro 08, 2006

Children of Men (2006), Alfonso Cuarón


Lá tive de ir ver este, já que a Marie Antoinnette está longe de aparecer pelas salas de Coimbra...
Alfonso Cuarón será sempre para mim o senhor que salvou o Harry Potter das adaptações fatelas. E isso é dizer muito. Sim, o terceiro volume da saga é um dos mais interessantes, mas a capacidade de estragar uma boa história anda por aí à solta e é imprevisível (cf. Ron Howard e o seu bloca buster do Vinci). E que o tipo tem jeito para a coisa, ninguém o pode negar.
Sobre os Filhos do Homem, bem, é um bom filme. Poderia ter mudado a minha vida se eu tivesse ido noutro estado de espírito ao cinema, i.e., sem a vontade irresistível de fazer piadas de tudo e mais alguma coisa. Digamos que me ri muito de coisas supostamente dramáticas, mas o filme, como todo o seu humor negro (para mim um dos melhores traços do filme) puxa pra isso.
A história passa-se numa Inglaterra futurista e perfeitamente verosímil. Terrorismo e poluição com força, e, pior de tudo, deixou-se de parir. Ou seja, a raça humana caminha para a extinção. Eis senão quando surge Clive Owen (o único ponto positivo do Reino dos Céus de Ridley Scottex), muito conformado com a sua vidinha de merda, e, de repente, tem a oportunidade única de salvar o mundo com chinelos de enfiar no dedo. Hurrah!
A história é excelente. Ainda mais quando podia ter fugido para fatela em tantos momentos. Matar a Julianne Moore logo na primeira meia-hora de filme (seria por honorários demasiado altos) foi uma boa opção. A tipa estava com um ar muito sonsinho, e o Clive Owen é muito mais atraente quando não tem tipas a cuspir-lhe bolas de golfe para a boca. Nada é desnecessário, os pequenos pormenores estão muito bem pensados, um final brusco, para deixar espaço à interpretação da obra aberta. Ou não.
Clive Owen, brutal, esse sotaque parte tudo, mas, muito mais que isso, és um cabrão de um bom actor e ninguém te pode tirar isso.
É um filme cheio de bons momentos. O nascimento do bebé, a saída do prédio por entre as caras espantadas de todos (e a explosão súbita que nos arranca do ambiente onírico), e mais que tudo, a ideia de salvar o mundo de chinelos. Ainda melhor que a ideia de construir um império de roupão (cf. Hugh Heffner).
A verdade, mes amis, é que eu tenho um estranho fascínio por filmes futuristas. Fui ver O Dia Depois de Amanhã ao cinema, e isso diz muito. E o meu filme preferido é o Inteligência Artificial. No fundo, eu adoro ficção científica, mas não fica nada bem a uma gaja dizer isso.
Vale a pena todos os cêntimos do bilhete. A sério. Não me desiludiu, pelo contrário. Ultrapassou em muito as expectativas.

quinta-feira, novembro 02, 2006

Rapace (2006), de João Nicolau


Vi este filme na competição internacional do IMAGO, e pude compará-lo com o melhor que se faz a nível mundial por jovens realizadores. Sim, eu sei que ganhou um prémio em Vila do Conde. Sim, esteve em Cannes na Semana dos Realizadores. Sim, se há alguém que não é expert em cinema português (ou mesmo cinema a nível geral) sou eu, que passei a adolescência a ver teen pics e filmes de serial killers. Sei isso tudo. Só não sei porque raio insistem que esta é uma boa obra. A sério. Expliquem-me.

OK, OK, o tema até prometia. Um pouco pseudo, mas temos de dar um desconto porque, afinal, o português é mesmo assim. Pretende dar uma de snob intelectual sem as bases para o ser. Mas o tema não basta para fazer um bom filme. Quer dizer, de boas intenções está o inferno cheio…

No mesmo festival tive a oportunidade de ver um filme de Adam Smith, em animação, chamado The Boy With No Name. E escrevi junto à descrição do fime ‘imitação descarada de Tim Burton’. Ora, este homem é bom, e não me cansarei nunca de dizê-lo. Nunca me desiludiu. Agora, Tim Burton só há um, e é ele. Copiar-lhe o estilo descaradamente sim, de certo modo é uma homenagem, mas não tem valor para além disso. Do mesmo modo que a maioria dos cinéfilos despreza o cinema comercial por não ter marca de auteur (e incluo-me neste grupo – são bons para lavar o cérebro apenas, para distrair, daí a designação recente de cinema pipoca), que podemos dizer de um cinema que imita a marca de auteur de outros.
Ora, quando saí da malfadada sessão, pensei para comigo – ‘ou o tipo está a tentar fazer uma imitação do João César Monteiro, ou julga, coitado, que está a inventar algo de novo’. Conheço a obra do César Monteiro melhor que conheço a do senhor Manoel de Oliveira – sorry! – e até que tem a sua piada estética, embora para mim aquilo não seja bom cinema. Um cinema baseado numa teoria estética, ou num conceito, cinema conceptual, chamemos-lhe assim, é… interessante, mas não é bem cinema. É filmar teses. (é a minha opinião e, como tal, já sabem, não tem qualquer valor whatsoever). Voltando ao João Nicolau, depois de ter espalhado aos quatro ventos o quão mau o filme é, a Lília orientou-me uma entrevista do realizador à Y do Público, edição de 5 de Maio 2006. E, tcharam! O senhor Nicolau tinha montado o último filme do Monteiro, assim como organizado a retrospectiva para a Cinemateca. Experiência prévia na realização: documentário (o rapaz vem da área da Antropologia). Afirma não ser cinéfilo (mas que raio de realizador é este? Ou quer dizer que não tem conhecimentos na área da história do cinema? É que são coisas diferentes. Soa a desculpa…)
O meu grande problema, daí a raiva sobre esta questão, não é ser um trabalho abaixo do razoável (erros de continuação e técnicos num tipo que já fez montagem a nível profissional? Que é isto?), porque, no final de contas, é um primeiro trabalho e nem todos podemos ser o Orson Welles. Tenho a certeza que o rapaz, se continuar por aqui, e parece-me que tem intenções, vai acabar por descobrir um estilo próprio e quiçá, tornar-se uma referência. Agora, engraxar o menino a dizer-lhe que Rapace é formidável, etc, etc… Por favor! E ao ler a reportagem da Y fiquei com sérias dúvidas se o sr. Vasco Câmara tinha visto o filme ou, numa atitude de aluno do secundário, sacado o resumo da net… Ok, numa reportagem sobre um realizador criticar negativamente os seus filmes não faz muito sentido… mas das duas uma – ou pensa o que disse e então discordo dele, ou então dourou a pílula e então pergunto – cadê a honestidade para com os leitores? E um prémio em Vila do Conde? A droga por esses lados deve bater bem!

Mas o que me irrita mais é julgarem que eu não gostei porque não percebi a intenção. ‘É representação teatral, os pormenores técnicos que falham são de propósito!’ Pois, e eu sou a Leonor Teles. O Hugo Leitão –ignoro qual a sua formação na área – é um péssimo actor de cinema teatral. Isto é, é a pior representação teatral no cinema que já vi. Não consegue transmitir a ironia e a alienação dos actores às ordens de César Monteiro. Ah pois, a mim não me vendem gato por lebre. As lebres tem orelhas compridas e não fazem ‘miau’!

Tinha mesmo de gastar o teclado do portátil com isto. São pequenas coisas como esta que me explicam porque é que o cinema em Portugal está tão mal. De um lado, pipocas e coca-cola para os filmes mais vistos de todos os tempos. Do outro, os pseudo-intelectuais que passam a vida a dar palmadinhas nas costas um dos outros, com medo de dizer que o rei vai nu porque podem passar por ignorantes da moda.

Para quando um cinema pós-César Monteiro e pós-Oliveira, pessoal adepto do film d’auteur? E onde estão os filmes comerciais que não roçam as novelas bregas televisivas, cujos lucros estão em directa proporção com o tamanho das mamas da actriz (atroz) principal?