quinta-feira, julho 31, 2008

Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull (2008), Steven Spielbergl

Este é daqueles filmes que uma pessoa pensa, “bolas, tenho de ir ver isto ao cinema. Tenho a impressão remota que era grande fã quando era miúda, por isso não posso perder esta oportunidade única de ver o Harrison Ford e o seu chicote e chapéu e etc etc etc. Além disso é um filme do Spielberg sem Holocausto, pró-semitismo ou extraterrestres.”

Quer dizer, o que pode correr mal, numa fórmula tão garantida? Todos gostamos de arqueólogos, têm o seu quê de perigoso e ousadia (os dos filmes, porque os da vida real não são bem assim – não, nada de Henry Jones ou Lara Croft nesta aborrecida dimensão…) Quantos foram estudar História por causa destes filmes? (quase tantos como os que foram para advocacia por causa da Ally McBeal ou para cinema por causa do Dawson’s Creek ou para enfermagem por causa do ER.)

Desta vez a acção passa-se nos anos 50, em plena guerra fria. E em vez de nazis temos os sempre divertidos russos, que na persona fascinante de Irina Spalko(Cate Blanchett) querem o conhecimento total. Ahhhhh… Acrescente-se o regresso da kiducha Marion Ravenwood, e do seu filho billyboy Mutt Williams, e temos uma boa premissa…

Mais uma vez, tudo joga no ‘Dr. Jones is older’. A reconstituição de época está bastante bem feita (estereótipos à parte – ah ah ah, rockabillies vs. Desportistas), Cate Blanchett é a coisa mais deliciosa que nos aparece no ecrã – o sotaque é tão bom, que desconfiamos se ela não será MESMO uma espia russa… Harrison Ford está muito bem (pudera, é o único papel que sabe fazer, e ninguém o faz como ele… :D brincadeirinha). É claro que se ele tivesse recusado participar na quarta parte da trilogia (oh, Douglas Adams, meu amori), Blanchett teria decerto feito um óptimo trabalho e sido nomeada para melhor actor 2008 (perdendo para o Ledger, claro). Shia Labeouf (raio de nome)… lá está, John Hurt é John ‘Elephant’ Hurt e por isso inatacável e Sean Connery faz a sua melhor interpretação de sempre como fotografia em moldura. Estive sempre à espera que entrasse um cameo de um Rolling Stone a qualquer momento, mas não, felizmente.

Deixando de ser mazinha, as expectativas eram médio-altas e o filme não desilude (se resolvermos esquecer a sequência formigas gigantes e macacos com armas… Lucas aproveitou a folga de Spielberg, claramente, para brincar com os computadores do CGI). Temos umas referências subtis aos filmes anteriores da série, e também algumas private jokes dos dois realizadores (que já cresciam).

Música John Williams – trabalho interessante no ta, tadatá…. Ta, tadá!... ta, tadatááááá´… ta tada ta tá… Adoro quando vemos pela primeira vez a sombra de Indy a agarrar no seu chapéu, em sombra… e, claro, o grande momentos das Cobras, esses bichos nojentos que fazem o senhor arqueólogo arrepiar-se de medo (inda mais depois da revelação que acabara de ter…)

O fim fim é novelesco (no sentido tviístico da palavra), o clímax – argh – um bocado fora e surreal demais, não? Os elementos sobrenaturais dos outros filmes não me chocaram tanto (ou então era por ser miúda), mas estes… hum… não sei não. Demasiado ahahahahahhahahahahaha.

Volta, ET, estás perdoado.

quarta-feira, julho 30, 2008

Goodnight Irene (2008), Paulo Marinou-Blanco

Devia haver uma lei que obrigasse todos os realizadores portugueses a irem passar uns meses a uma escola de cinema americana, para aprenderem o que é a linguagem cinematográfica. Não quer dizer que se tornassem comercialóides, ou a seguissem, mas como os meus profs se fartaram de encher a cabeça, ‘é preciso saber como fazer para podermos fazer ao contrário’.

Porque o ponto forte deste filme é mesmo o domínio da linguagem, e a belíssima fotografia, e, é claro, um elenco de fazer chorar as pedras da calçada de tão bom que é. Primeiro que tudo, o inglês mal disposto de Robert Pugh (lembram-se dele decerto de Master and Comander) – rabugento, deliciosamente mal-educado, ahhhhh, e com sotaque britânico. Depois, Rita Loureiro como a pintora inconstante Irene, que desaparece a meio do filme. E Nuno Lopes, o serralheiro de estranhos hábitos mas que, apesar de tudo, sabe falar inglês – viva a globalização!

E pronto, uma história de ‘vamos morrer de bem com a vida’, ainda não perfeitamente desenvolvida (é o primeiro filme do rapazinho, temos de dar um simpático desconto[1]), que acaba num anti-climax que seria genial se não nos fizesse chorar por mais. Sim, depois do desaparecimento de Irene e até que eles se resolvam a pôr-se à estrada em busca dela (mas principalmente deles), há um tempo morto que, hum, devia ser mais curto. Sim, a parte mais divertida é sem dúvida os momentos ‘D.Quixote’ nas estradas desertas de Espanha.

As sequências oníricas estão muito bem feitas, com destaque para os momentos em que Alex (a personagem de Pugh) se farta de narrar sobre ilhas paradisíacas e vai fumar para o meio do vídeo, enquanto o casal apaixonado olha para ele. E o plano inicial (que só mais tarde saberemos ser o ponto de vista subjectivo de Bruno (Nuno Lopes), é.. tão… estrangeiro… (sendo este adjectivo um elogio).

Com música de Carlos Bica e Jaroslaw Bester, uma cinematogafia belíssima de Lisboa por Miguel Sales Lopes – afinal Lisboa não é azul, é laranja – e um ritmo que, mesmo nos tempos mortos já referidos, nunca nos deixa aborrecer – Goodnight Irene parece-me uma confirmação do renascimento da ‘terceira via’ do cinema português. Vá lá, ICA, não sejas mauzinho, dá-lhe outro subsídio.



[1] Quer dizer, ele tinha já feito uma coisa chamada The Curse of Marcel Duchamp, mas é uma curta. Nela Duchamp regressa dos mortos para punir pintores pretensiosos de Nova Iorque… uhhhhh….

Shine a Light (2008), Martin Scorsese

Após ganhar o óscar ao fim de não sei quantos anos a babar-se para cima do Robert De Niro, Marty resolveu dar uma de Godard e filmar os dinossauros aka Brigada do Reumático praticamente desconhecidos Rolling Stones. Hum. Filmes concerto, que não são em 3-D, nesta altura do campeonato, são sempre bem-vindos, mas será que acrescentam alguma coisa à curta história dos filmes-concerto???

O trailer é apelativo: ouvir Scorsese transformado em neurótico allenesco com os problemas que acarretam filmar um concerto de tal envergadura é qualquer coisa. O problema é que, os momentos de bastidores que aparecem no trailer, são os momentos de bastidores que aparecem no filme. Sim, assim tão pouco! Além das músicas propriamente ditas, também temos algumas entrevistas, sobretudo material de arquivo, que joga com a noção que eles nunca pensaram estarem a tocar com aquela idade, etcet etc. Sim, já percebemos que eles estão velhos. Sim, já percebemos que o Mick Jagger mexe-se que nem uma miúda de 15 anos. Sim, já percebemos que o Keith Richards é passado da cabeça. E???

Eu nunca perdoarei o Scorsese por não aparecer na versão final do filme (mas aparece na ost) a minha preferida dos Stones, Paint it Black. E pronto, vemos os Stones a abanarem-se em palco, a cantarem com garra (momento estranho no início quando Clinton aparece a apresentar o concerto…), com luzes que fazem as pessoas arder (sem o extra point de acontecer efectivamente algum desastre), e pronto, uns planos marados de grua, coiso e tal…

É muito raro um filme de concerto ser melhor que um concerto, e este não é. Além disso, parece que o senhor Scorsese está mais a fazer um hino à velhice e resistência dos Stones do que propriamente à sua música (que continua boa). É porreiro ouvir, convidados e tal, mas… ná… não me convence. Este é claramente um filme menor, ou de encomenda, ou um check na to-do-list. Nada mais do que isso.

Ok, é engraçado ver o baterista a suspirar e a limpar o suor da testa com as mangas, ou Richards a sair do palco numa evocação Raging Bull (o último plano, subjectivo, é muito bom), e a ignorância dos Stones nos anos 60. Mas, além disso, está lá mais alguma coisa? Não me pareceu. É bom, mas porque os Stones são bons – o filme nada faz para piorar ou melhorar a coisa.

Miss Pettigrew Lives For a Day (2008), Bharat Nalluri

Ora muito bem - que raio está a Frances McDormand (vulgo senhora Fargo) a fazer num filme ao lado da cantadeira e cartoonesca Amy Adams???

Respondo-vos eu: a fazer mais um feel good movie que vai decerto passar na nossa televisão naquela bela época que normalmente chamamos de Natáli. Mas não entendam isto como depreciativo: fossem todos os filmes que somos obrigados a suportar enquanto comemos bolo-rei e bebemos champanhe assim, seríamos decerto pessoas mais felizes (damn you Barbie e o Lago dos Cisnes!)

Primeiro, é uma comédia de época. Isto significa roupa, roupa de época. E sapatos, e bolsas, e lingerie… ahhhhh. Depois, tem a McDormand, que não é só boa actriz quando trabalha para o marido. Está aqui deliciosa como mulher desempregada que, em busca de dinheiro, faz-se passar por uma assistente pessoal da mimada Delysia (uhhhhhhh), interpretada por uma surpreendente Amy Adams. Ora, Delysia precisa de ajuda para lidar não só com a parca arrumação da casa, mas também com os seus três namorados: o dono da casa onde vive, o filho do produtor musical que lhe poderá dar um papel num musical (assim concretizando o seu velho sonho de ser actriz) e o pobre pianista com quem cantava num clube nocturno. Portanto, Guinevere (o nome da personagem de McDormand) tem de a ajudar a nem mais nem menos do que encontrar o amor verdadeiro. Ohhhhh. Isto num só dia, enquanto aviões alemães sobrevoam Londres, e encontrando também – surpresa das surpresas – o amor verdadeiro para si própria. Ohhhhhhh.

Os diálogos são inteligentes, a fotografia deliciosa, a reconstrução histórica bastante cuidada (nota máxima para o director de guarda-roupa), música não me lembro bem (o que significa que não era assim tão má ou assim tão boa…, feita por Paul Englishby, responsável entre outras pela bso das curtas Ten Minutes Older: The Trumpet), actores estupendos na recriação de um tipo de comédia que parecia perdido nos confins do studio-system (aka screwball comedy).

Grandes momentos: principalmente a questão da máscara social, e da grande revelação final sobre Delysia – e a sua decisão arrancada a ferros, diga-se. O ‘caso’ de Guinevere é um pouco previsível, mas pronto, é uma feel-good comedy, não é um filme do Haneke.

Sim, é um filme de outros tempos, mas de vez em quando sabe tão bem…

Reservation Road (2007), Terry George

(como tenho as críticas aqui atrasadíssimas, resolvi apenas passar a crítica que mandei para a Cabra.... sorry)


E se um desconhecido lhe atropelasse o filho?

Ethan Learner (Joaquin Phoenix) é um professor universitário feliz, até ao dia em que, ao regressar do concerto do filho com a família, uma tragédia acontece em Reservation Road. Dwight Arno (Mark Ruffalo) é um advogado que tenta a todo o custo ser um bom pai para o seu único filho, que vive com a mãe. Um peso na consciência sobre uma certa noite em Reservation Road fá-lo viver angustiado, dividido entre a confissão do seu crime e o manter contacto com o seu filho.

Podia ser um novo 21 Gramas, mas Terry George (que já nos dera Hotel Ruanda) não consegue levar o espectador a questionar-se profundamente sobre os dilemas éticos que caem sobre as duas personagens principais (Será justo que o castigo por matar alguém seja a morte? Pode-se julgar as pessoas pelos seus actos? Deve-se chorar os mortos ou reaprender a viver com os vivos?), limitando-se a fazer-nos seguir atenta e tensamente a trama à superfície (que não é de modo nenhum superficial), esperando o momento de redenção final de ambos, que deixará, apesar de tudo, um gosto amargo na boca.

Joaquin Phoenix, quase irreconhecível na figura de barbudo patriarca, encarna um colosso de angústia, frustração e tristeza que nos leva à imediata simpatia pela personagem, deixando na sombra a sua mulher Grace, interpretada por Jennifer Connelly. Já Mark Ruffalo – o ponto forte do filme - impressiona pela capacidade de emprestar profundidade à personagem, a mais complexa da história, e a que mais facilmente soaria pouco credível se o actor não estivesse à altura.

De resto, é um filme que, entre ser um drama social e um drama doméstico, escolhe sem muita certeza a segunda opção, abandonando de todo a possibilidade de ser ambos e caindo em clichés que servem apenas para tentar manipular as emoções dos espectadores, numa abordagem “Casos da Vida Real” que não resulta de todo…

domingo, julho 20, 2008

Youth Without Youth (2007), Francis Ford Coppola

Ao ver pela primeira vez (Alas! Alas! )um filme tão abalroado pela crítica, que o apelidou de incompreensível, gratuito e até – crueldade das crueldades – enferrujado, começo a pensar que tenho um problema qualquer com filmes destes. Será que sou só eu que acho o filme excelente?

Penso na fraca recepção de Apocalipse Now quando estreou, e como envelheceu graciosamente na estima dos críticos. E agrada-me pensar que Uma Segunda Juventude (estas traduções perdem a subtileza do original, mas podia ser pior…) também é isso, um filme maior fora do seu tempo, demasiado à frente para ser compreendido, demasiado complexo, demasiado simbolista e efabulatório. Mas pronto, pode não ser. Como enorme fã de devaneios cinematográficos a la Lynch e Greenaway, a minha opinião pode ser posta em causa.

Dominic Matei, interpretado por um subvalorizado Tim Roth[1], é o protagonista improvável de uma narrativa não linear – porque o tempo não existe -, um professor de Linguística em busca do conhecimento total e que, por um acaso, consegue tudo o que deseja – o conhecimento, o amor, a juventude – para depois se aperceber que terá de abdicar de tudo e enfrentar a morte, como um menino bem comportado.

O tiquetaque do relógio, a evocação constante da vanitas renascentista iniciam o filme, que por momentos parece ser um mísero remake mais realista (mas ainda com o seu quê de fantástico) de The Fountain de Aronovsky. O duplo, as rosas, Veronique que é Laura (como a de Dante) e Rupini relevam a profundidade do filme num brilhante retratamento da história de Dorian Gray.[2] E mesmo o final, que à superfície parece demasiado simplista, demasiado fácil, revela um twist que acrescenta ainda mais uma camada de complexidade a um objecto demasiado rico e que demorará anos, décadas, a ser digerido mesmo na sua parcialidade. [3]

As grandes questões da Humanidade – o mistério da natureza, a metempsicose, a juventude eterna, o conhecimento ilimitado (Gray meets Fausto) – com todos os dilemas morais que tais items levantam são também postos em confronto com o impulso irresistível do ser humano em direcção à sua própria destruição: “Só importa o conhecimento e a perfeição do ser humano”.

Em termos estéticos (ou técnicos, ou formais, ou aquelas coisas que não interessam a ninguém salvo aos idiotas como a autora que querem fazer filmes), há um reaproveitamento do vocabulário de Apocalipse Now (ambos os filmes falam da guerra, mas o que é o tema num, é a nota de rodapé noutro), com belíssimos planos nocturnos, ângulos pouco habituais e a exploração iconológica do mundo dos sonhos e pesadelos. Muito bom a ideia de usar os planos ao contrário para indicar a passagem do onirismo ao (?) realismo. A notar também o estilo vintage usado com os planos clássicos e estáticos (numa altura em que as steadies proliferam que nem pulgas no meu cão, nota-se, permita-se o termo, bué.) e a evocação desse mesmo classicismo nos créditos iniciais.

Há também a sugestão de que a morte é o início e não o fim – vejam com atenção a cena do passaporte.

E quando alguém alcançou a juventude, o conhecimento absoluto do passado e do futuro, o amor há muito perdido, que resta fazer? Pelo menos o café do costume está sempre aberto para irmos ter com os nossos amigos…

Não há muitas coisas límpidas neste filme – algumas sabem a línguas remotas e misteriosas, que mesmo sem sabermos o que significam ressoam na nossa mente primitiva, como é o caso das três rosas.[4] E agora uma frase fatela: mais que um filme, um compêndio da Humanidade. Ahhhhhhh…. Quem gostou de Inland Empire quase de certeza que vai adorar este.

Era uma vez um rei que sonhava que era uma borboleta que sonhava que era um rei que sonhava que era uma borboleta que sonhava que era um rei…



[1] Se gostam de ver o Tim Roth a fazer papéis esquisitos, recomendo fortemente um dos meus filmes preferidos, onde ele contracena com nada menos que Gary Oldman: Rosencrantz and Guildenstern are Dead, de Tom Stoppard.

[2] Um chupa para quem conseguiu atingir a genialidade das palavras e duplos sentidos utilizados.

[3] Note-se que eu não estou a elogiar o filme por ser incompreensível. Acho-o bom pelos sentidos que lhe adivinho e que me são sugeridos por ele, mesmo no seu bem estruturado caos significativo.

[4] Comparado com isto, o final do Planeta dos Macacos do Burton é facílimo de se explicar.

My Blueberry Nights (2007), Wai Kar Wong

O senhor de Disponível para Amar volta com aquilo que foi em Cannes apelidado de ‘desastre’.

Mas quem quer saber da opinião dos franceses para alguma coisa?

A premissa com o cast mete um bocado de medo: Norah Jones e Jude Law, Rachel Weisz, Natalie Portman (ok, nem todos são imediatamente associados a ‘elementos de desaste’…), numa história – pensamos nós – de amor e de procura, com muita tarte de mirtilo à mistura.

A banda sonora (que aproveita algum repertório da protagonista) envolve-nos como um tépido banho quente, em nuvens vaporosas de odor a pãezinhos quentes e pastéis acabados de fazer…

Não, Norah Jones não é a melhor actriz do mundo, mas safa-se muito bem. A sua cara – aliás, a maneira como o senhor Wong filma a cara dela – dão-lhe um ar exótico, oriental, mirtilado. Jude Law é Jude Law, com uma ligeira evocação da personagem Alfie (se bem que tão diferentes…) Rachel Weisz como vadia incompreendida é a minha personagem preferida, de longe. E Natalie Portman – não é Ana Bolena aqui, não senhora. Bom sotaque. Quase irreconhecível, diria eu, que tenho má memória para caras. E claro, o senhor (?) é genial.

A narrativa nem que é assim tão previsível como seria de esperar. Ok, um final fechado, mas reparem na arte de acabar o filme antes de começar a estragar a coisa!

Porque o verdadeiro protagonista do filme é, como sempre, Wong Kar-Wai. As suas cores saturadas e mornas, o seu fascínio pelas luzes da urbanidade, os planos voyeuristas de fora da montra (no início, enquanto não somos formalmente convidados a entrar na história), o jogo formal com a câmara da loja (que mostra uma das lutas mais interessantes dos últimos tempos, no cinema – quer dizer, mostrar não é a palavra certa – o que pode levar a reflexões interessantíssimas sobre a contemporaneidade e as câmaras de vigilância, etc, etc, etc), os campos-contracampos com enquadramentos pouco usuais o uso profuso do freeze, slow motion, fast-foward e filtros, sem parecer um formalista oco…

Não posso pôr as minhas mãos no fogo sobre a qualidade dos outros filmes do senhor – só vi um. Mas todos insistem que esta é uma obra menor. Se é, tenho mesmo de ver mais filmes dele.

Bem… sabem, acho que o problema não é do filme em si. (muito americano para o gosto dos fãs, tenho por aí ouvido dizer). É como as tartes, parece-me. O cheesecake acaba sempre. O bolo de chocolate está quase no fim. E ninguém pede tarte de mirtilo. Não quer dizer que ela não preste, ou que as outras sejam melhores. As pessoas é que fazem outras escolhas…

P.S. I Love You (2007), Richard LaGravenese

Como ia passear-me à Irlanda, pareceu-me boa ideia ir ver uma adaptação de uma história originalmente passada lá (que no filme é relocalizada nos States, mas com uma viagem à ilha Esmeralda para compensar). Também me pareceu uma excelente ideia ver o Gerald Butler com sotaque irlandês (ele que é originalmente escocês), com pouca roupa e a cantar música irlandesa. Nada como um bom filme inconsequente para nos esquecermos das amarguras da vida. Ou para nos esquecermos da quantidade de trabalho que temos de fazer para a Universidade, que é quase a mesma coisa.

Além disso, tem o Gerald Butler. Leóoooooooonidas. Já tínhamos mencionado isso?

A premissa é a seguinte: após a morte do marido, Gerry, Holly descobre que ele lhe deixara dez cartas para a ajudar a voltar de novo à vida. A parte mais interessante é claramente a viagem à Irlanda, onde Holly se lembra de como o conhecera e de quão bela é a Irrrrlanda. Ahhhhhhh….

Sim, é um chick flick. Mais, a adaptação (mais ou menos livre) de um romance de Cecelia Ahern .Mas é dos bons, valha-nos isso. Primeiro, não é assim tão previsível. Não, Holly não fica com o amigo que a amava desde sempre. Nem sabemos sequer se fica com o irlandês bem parecido que era amigo do marido. Ná. Isto é mais uma historia de – ya, o amor é lindo, mas temos de aprender a viver por nós. Holly passa da mulher sem objectivos de Gerry (eles casaram-se muito novos) para uma designer de sapatos bem sucedida.

Hillary Swank fica muito bem a não fazer de boxer, realmente. É claro que o que realmente interessa é Butler de tronco nu, mas ela vai dando um ar da sua graça (no qual só reparamos quando o tronco nu de Butler não está no ecrã, sorry).

Gosto bastante de várias coisas neste filme. Primeiro, o Gerald Butler. Depois, o sotaque irlandês do Gerald Butler. A seguir, a verdura e planura da Irlanda que confirmei com os meus próprios olhos na semana seguinte. Também a Lisa Kuprow (Phoebe dos Friends) a fazer de devoradora de homens. A cena do funeral. O William (auf auf auf). E toda a música irlandesa que se passeou durante o filme, especialmente The Galway Girl. Yehhh. Grande destaque para o momento do karaoke, em que Holly tenta ser sexy e tropeça nos fios indo parar ao hospital. Muito, muito giro.

Menos bom? O Gerald Butler ter morrido logo no início e assim não termos tido a oportunidade de o ver ainda mais vezes em tronco nu, se bem que os flashbacks sejam bastante sumarentos…

Bem, por esta altura já perceberam a minha major reason para ir ver o filme… Yeahhhhh….

Mas pronto. LaGravenese, que é ainda um realizador verdinho, fez um trabalho um bocadinho mais do que simplesmente competente, mas que não chega para converter espectadores menos dispostos a ver chick flicks apenas razoáveis…

Sim, é um filme de domingo à tarde na televisão. Mas e depois? Também não tem o direito de viver??

quinta-feira, julho 17, 2008

Die Fälscher (2007), Stefan Ruzowitzky


Os óscares de Melhor Filme Estrangeiro são possivelmente os únicos com alguma isenção, já que os produtores não têm dinheiro para engraxar os membros da Academia. Outra coisa boa desta categoria é que o filme que ganhar tem fortes possibilidades de passar na Lusomundo, ao contrário do muito bom cinema que nos passa ao lado por causa dos estúpidos dos exibidores.

Temos aqui mais uma historiazinha da Segunda Guerra Mundial, etc etc etc. Mas com o seu quê de originalidade, graças aos deuses. Porque o protagonista não é um patrão alemão que tem pena dos judeus, nem um pianista judeu a fugir dos alemães, nem a própria encarnação do demo aka Adolfo Hitler.

Nada disso. Os Falsificadores (tradução portuguesa) conta-nos a história de uma das maiores – adivinhem – falsificações da história. Os nazis decidiram conquistar o mundo inundando os países inimigos de dinheiro falso, fazendo as economias colapsar.

O nosso protagonista anti-heróico é um judeu biblicamente chamado Salomon, mas todos lhe chamam Sally – o que é um bocado abichanado, mas pronto. Ele goza de altos talentos no submundo do póker e casas de jogo em geral, fazendo uns biscates como falsificador de documentos. Entretanto, para a história poder desenvolver, ele é apanhado e levado para um campo de concentração. Ao exibir as suas fantásticas qualidades, os alemães depressa o transferem para uma coisa bastante parecida com um resort de férias no meio de um campo de concentração – com mesa de ping pong e tudo. Entretanto, um tipo chamado Adolf Burger tem lampejos revolucionários e faz tudo o que pode para sabotar a operação de dentro. Sally tem alguns problemas de consciência – prolongar a sua vida e a dos seus companheiros ou não colaborar com o inimigo – mas…

Primeiro que tudo, o aspecto técnico como sempre. O senhor Ruzowitsky utiliza a ‘velha’ técnica de steady cam, o que não é usual neste género de filmes (e temáticas). Quer dizer, este género de filmes tem sempre um estilo clássico. Mas não. Quer dizer, não é o Bourne Ultimatum, mas percebem o que quero dizer…

Depois, os actores. A fazer da minha homónima Sally temos Karl Marcovicz. A cara dele não vos é estranha? Pois. Pensem naquela série fantástica cujo título original era Komissar Rex. Exactamente…

Ele faz um papelão. Toda a ambiguidade da personagem – nem no fim percebemos se ele está a tentar salvar a pele ou tem algum tipo de consciência universal pelo que se passa à sua volta (ele sabe – há um momento no jogo de ping pong que matam um judeu mesmo do outro lado da parede de madeira…)

Também muito bom é August Diehl, como Adolf Burger. Tão bom que há momentos em que só nos apetece dar-lhe porrada. Ok, estão a ajudar os nazis, mas então e o companheirismo, ahein?

Grandes momentos – as festas no campo de concentração, esse tal momento do jogo de ping pong, a maneira como a história começa no fim, com Sally e a mala de dinheiro, mulheres à disposição até que ela descobre o código de barras no braço… Menos bom? Não me lembro. Mas também sou um pouco suspeita em filmes sobre a II Guerra Mundial…

Grande trabalho de fotografia por Benedict Neuenfels, suíço. O ar sujo de tudo, mas ao mesmo tempo não completamente cinzento… muito bom.

Pronto, e não vi os outros nomeados, mas sim, um novo clássico, como berra o IMDB.

terça-feira, julho 08, 2008

10.000 BC (2008), Rolland Emmerich


Emmerich, o Ed Wood dos grandes orçamentos, volta, desta vez sem destruir Nova Iorque, mas com pirâmides e extraterrestres – ele leva a definição de marca de autor demasiado literalmente, parece-me.

Não sei se foi de ir sem expectativas nenhumas, ou do último filme que tinha visto ser tão … tão… argh, o certo é que esta coisa com mamutes, pássaros estranhos e carnívoros (vide poster) e tigres dentes de sabre me tocou no fundo do meu ser. Desde o Shoot ‘em Up que não via uma coisa no cinema que me divertisse tanto.

Toda a mitologia em volta do herói, D’leh (um homem das cavernas que, evidentemente, fala inglês americano), que se torna o salvador da tribo apenas por acidente, é francamente ridícula, se contada, mas faz todo o sentido enquanto estamos no escuro a fazer barulho com a palhinha na Coca-Cola. Sim, porque ele irá salvar a sua amada, Evolet, das garras da terrível tribo nómada que a rouba a ela e aos seus amigos para trabalharem para lá do sol posto, nas pirâmides dos deuses dos céus.

Emmerich é o Spielberg da série B, só vos digo isso. O grau de xunguice que percorre todo o filme, com D’leh a proclamar a união entre todos os povos, enquanto tenta salvar a sua amada, é amigo dos animais (mesmo daqueles muito grandes e muito esfomeados), são-lhe dadas as sementes que o permitem passar ao próximo nível de civilização, e tudo isto com o seu peito masculíssimo sem um único pêlo… como é possível não gostar de algo tão descaradamente mau???

Infelizmente, parece que o tempo que perderam de volta do difícil efeito de fazer chover sobre um tigre dentes de sabre (demoravam semanas a renderizar um único minuto da cena) fê-los esquecer o render noutras partes, em que parece que mudamos drasticamente do HDV para a Super 8. (quando D’leh, já no Vale dos Reis, tenta convencer os guardas a unirem-se todos, qual movimento comunista, contra o patronato opressor). Mas que interessa, quando nas cenas seguintes nos tentam convencer que, 1. As pirâmides já estavam construídas antes mesmo de passarmos de caçadores para recolectores; 2. Foram os extraterrestres que as construíram, quer dizer, obrigaram os pobres dos humanos a construí-las. (boa jogada, o só vermos a cara do et no fim de ele estar morto. Aprende, Spielberg!)

E como não só de ets, marximo-leninista, mitologia grega e plantas que crescem se faz um filme, eis que no fim nos é dado o golden egg da série B: após matar uma das personagens mais importantes, Emmerich, descaradamente, RESSUSCITA-A!!!!! Muito bom, muito bom, muito bom!!!!

E sim, os mamutes são os novos pinguins. Sem dúvida. (numa nota mais séria, o filme avança imenso na junção de CGI com acção real, sem parecer o Quem tramou Roger Rabbit versão pc. Ou os Sims[1])

E porque mais filmes destes são precisos para alegrar o Verão,

Do Not Eat Me When I Save Your Life!



[1] Pois, estou de férias, vou poder jogar Sims até cair para o lado!!! Yehhh!!!!

Love in the Time of Cholera (2008), Mike Newell


A dificil tarefa de adaptar um livro muito, muito bom (segundo dizem) ao ecrã nem sempre corre bem. Aliás, é raro correr bem. Mas é o Mike Newell, e Ronald Harwood, o argumentista do Pianista…

Ambos precisam de uma carga de porrada. Voluntários?

Ainda pensei que fosse da minha alergia sazonal às histórias lamechas de amor – compreendam, estarmos a limpar o cérebro da nossa platonice de há 4 anos e ir ver um filme sobre um tipo que esperou uma data de décadas… - mas não. Não não e não. É muito mais que isso.

Primeiro que tudo, o ar produção da Globo que o filme tem todo. Começando pelos malfadados créditos com florzinhas, e zoomzinhos, e musiquinha de fazer bebés… ainda pensei: hum, será que estou no meio de um pesadelo? Mas não. O pior ainda estava para vir.

Ver o Bardem com ar de cachorrinho atrás lá da Fermina é, no mínimo, assustador. (ainda demais poucos dias depois de ver No Country For Old Men…) Acrescente-se o pior trabalho de maquilhagem que alguma vez vi num filme, e estou a incluir trabalhos amadores de colegas meus. E Shakira, por amor dos deuses???? Shakira como banda sonora???? Em que raio estavas a pensar, Newell??? (atenção, não estou a desdenhar da qualidade musical da cantora, que tem, na minha opinião, uma voz fantástica. Estou a desdenhar do ridículo e ‘golpe-comercialóide-frustrado’ que é pôr canções dela como única banda sonora…)

Atenção, há coisinhas boas. Tipo, o excelente livro que se consegue, apesar de tudo, perceber atrás de tanta falta de jeito/tacto. Parece que pensaram: bem, o livro nunca vai ser suficientemente bem adaptado para o cinema, por isso deixem-nos ganhar uns trocos enquanto fazemos o mínimo possível. Sinceramente. É que isto já parece um golpe das livrarias, tipo veja o filme. Compre o livro, ou então, numa vertente ainda mais assustadora, as Cliff Notes, agora em formato cinematográfico.

Bem, depois deste relembrar de todos os pensamentos que me atolaram durante o intervalo, vamos lá ver… Bardem é um excelente actor, e está aqui num registo fantástico (pena a péssima maquilhagem quando ele envelhece… onde é que tinham a cabeça, onde???) Giovanna Mezzogiorno (aka Fermina) tem um sei que de beleza estranha, foi bem escolhida para a personagem, embora até doa a diferença abismal quando tem de partilhar o ecrã com Bardem (não é que ela seja má de todo, ele é que é bom demais). Depois, Benjamin Bratt como aquele idiota do Dr. Juvenal (sim, ódio às personagens, ódio às personagens é que é bom) – adoro quando ele morre, principalmente da maneira que morre.

Outra coisa fantástica é o chamado ‘body count’ de Florentino (Bardem). (fantástico, excelente, etc etc… vê-se bem que desliguei o cérebro para as férias). Principalmente a primeira vez em que ele descobre as alegrias do sexo no navio… muito, muito bom. A cara de totó, a máquina sexual… fantástico. E a sua grande frase final, quando finalmente consegue Firmina – ‘eu mantive-me virgem para ti’ – geeeenial. Sim, essa genialidade parte do Marquéz e não dos imbecis que fizeram este filme, mas pelo menos deixaram estas coisas para nós podermos apreciar – podiam tê-las cortado impiedosamente. E, alguém tem de dizê-lo, grandes cenas de sexo. Se calhar foi pela atenção a elas que se esqueceram que o resto do filme também merecia um bocadinho mais de trabalho...

Sinto-me estúpida por estar a tentar lembrar-me de coisas que vi há muito, muito tempo atrás… Não me lembro de pormenores inteligentes nenhuns… Mas tenho de keep up até aos filmes recentes – é a minha OBRIGAÇÃO MORAL VIRTUAL. E isso tem muito peso. Ou não.